Na próxima, votemos em Rasmus Ruffer
á não se sabia muito bem onde acabavam as medidas do Memorando de Entendimento assinado com a troika e onde começava o programa do Governo para as finanças públicas e ontem levantaram-se legítimas suspeitas sobre onde começa a responsabilidade do ministro das Finanças para com os cidadãos e onde acaba a da missão dos enviados da Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI. Numa clara negação das promessas de "transparência" e num gesto de evidente desprezo pela da esfera mínima da soberania nacional, o ministro que devia explicar a dimensão da derrapagem das contas públicas deste ano, a sua origem e os meios para a debelar nada disse sobre o tema e quem teve a preocupação de nos esclarecer foram senhores com nomes tão portugueses como Jurgen Kroger, Poul Thomsen ou Rasmus Ruffer.
A troca de papéis e de identidades desenrolada numa peça em dois actos que decorreu em apenas uma manhã é uma vergonha com um único mérito: o de mostrar que, se não for o Governo, há mais quem se preocupe em dizer-nos que há um buraco de 1900 milhões de euros nas contas de 2011 ou que em breve o Governo transferirá para o domínio do Estado o fundo de pensões dos bancários para atacar o problema. No difícil processo que nos obriga a uma severa austeridade para tentar solucionar o caos das contas do Estado, quem ontem prestou contas aos cidadãos não foi o Governo que elegeram, mas uma entidade burocrática e efémera que a dura realidade das contas do Estado lhes impôs.
Não sabemos se esta estratégia de ataque ao "desvio colossal" anunciado há semanas pelo primeiro-ministro foi decidida no Conselho de Ministros de anteontem ou se já estava há muito gizada. E percebe-se que, antes de ser tornada pública, fosse comunicada aos representantes da troika. O que não se entende são as razões que levam o ministro a dar a cara por um novo agravamento do IVA às nove da manhã sem se preocupar em contar tudo o que tinha sido decidido e dito à troika. Erro de cálculo, falta de sensibilidade, inexperiência num cargo que lhe exige prestação de contas aos cidadãos? Talvez de tudo um pouco. Mas o que fica para a posteridade é a inaceitável imagem de um país e de uma soberania de cócoras, onde já ninguém se sobressalta ao dar conta que é um corpo estranho, e não o Governo democraticamente eleito, a fazer o favor de dizer aos seus cidadãos o que está a ser feito para mitigar os seus problemas.
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