6.1.12

estradas
Compensações às empresas quase duplicam custos do Estado com PPP



Um Mi(ni)stério Público



Parece que o Ministério Público abriu, após queixa de um "grupo de cidadãos", um inquérito às declarações de Otelo, que, em entrevista à Lusa, terá dito: "Para mim, a manifestação dos militares deve ser, ultrapassados os limites, fazer uma operação militar e derrubar o Governo".
Não disse contudo que os "limites" tenham sido ultrapassados neste momento mas, sim, em 1974: "Esse limite foi ultrapassado em 1974 e culminou com a "Revolução dos Cravos".
Otelo é, como se sabe, um criminoso. Cometeu um imperdoável crime na madrugada de 25 de Abril de 1974, que hoje seria punido com 5 a 15 anos de prisão. O MP não abriu, porém, qualquer inquérito. Talvez, que sei eu?, porque não tenha sabido ou nenhum "grupo de cidadãos", dos muitos que não gostaram da coisa, se tenha queixado.
Agora, que os tempos vão de feição, já apareceu quem se queixasse. Tudo indica que dando as declarações de Otelo como "instigação pública a um crime", punida pelo artº 297º do Código Penal, se não pelo 326º. Estranho é que o MP, vinculado pelo seu Estatuto, "a critérios de legalidade e objectividade" e não de conveniência política, não tenha também aberto um inquérito às declarações de Belmiro de Azevedo segundo as quais "quando o povo tem fome, tem o direito de roubar", puníveis, com muito menos boa (ou má) vontade, pelo mesmo artº 297º e em que a acção penal não depende sequer de queixa. Mistérios públicos do Ministério Público...

5.1.12

Uma conspiração de patetas

Por Ana Sá Lopes
Em Portugal, em tempos críticos, há sempre alguém que conta uma anedota parva

Ao que parece, um magistrado foi obrigado a abrir um processo contra Otelo Saraiva de Carvalho por causa de umas declarações patetas. A lei obriga a justiça a satisfazer a queixa (ainda mais pateta) de um “grupo de cidadãos” que acha que Otelo deve “ser responsabilizado” pelo que diz. Em uns e outros existirá a crença genuína de que as declarações patetas de Otelo podem prefigurar, a sério, a sério, um “crime contra o Estado de direito”? É duvidoso.
Num país em que a lentidão da justiça é um problema nacional, uma notícia destas ajuda a perceber mais facilmente que a situação não se deve, seguramente, apenas à “falta de pessoal”. O Departamento de Investigação e Acção Penal é um sítio saturado, com imenso que fazer, por onde passam milhares de processos. E, no entanto, alguém é obrigado a abrir mais um para investigar se uma tontaria de Otelo Saraiva de Carvalho a defender “uma operação militar” para “derrubar o governo” é ou não é um crime.
Em alguns blogues de direita, houve algum burburinho sobre a necessidade de “responsabilizar” Otelo e não o deixar “impune”. Houve quem invocasse o Código Penal, nomeadamente o “crime de atentado contra a realização do Estado de direito”, que avança com uma pena de prisão para quem, “por meio de violência, tentar destruir, alterar ou subverter o Estado de direito constitucionalmente constituído”. Também há pena para “quem publicamente incitar habitantes do território português ou forças militares” a essa prática. Otelo incitou a um golpe de Estado? Oh, Deus, limitou-se a dizer que ele se faria num instantinho, que bastavam “800 homens”, etc.
Todo o disparate do grupo de cidadãos que apresentou a queixa funciona a favor de Otelo, evidentemente, que decerto agradece, como já se viu ontem. É a sua oportunidade de, tantos anos passados, poder voltar a fazer de glória nacional – depois do “Campo Pequeno” e das FP-25 – agora, vítima de atentado contra a liberdade de expressão ou coisa que o valha.
O grupo de cidadãos poderia ter dado largas à respectiva indignação protestando no “Opinião Pública” de uma televisão qualquer. Ficava mais barato ao Estado, que vai ter agora um magistrado ocupado com uma diversão. A história demonstra que existe um sistema de “checks and balances” muito português: em momentos absolutamente críticos, alguém conta uma anedota parva.

4.1.12

Sabe bem pagar tão pouco

 António Costa 
O senhor Alexandre Soares dos Santos decidiu deslocalizar uma sociedade que controla 56% do grupo Jerónimo Martins para a Holanda, uma espécie de paraíso fiscal das ‘holdings’ internacionais e que é, por isso, um captador líquido de investimento estrangeiro de cariz financeiro.
A decisão, absolutamente racional, não justifica reparos, não fosse Soares dos Santos um empresário que nos pede, em tom de lição moralista, para não desistirmos do País.
Qualquer contribuinte, seja empresa ou individual, toma as suas decisões com base em critérios de eficiência e eficácia, ou, dito de outro modo, escolhe a forma e o modelo que lhe permite pagar menos impostos. E, desde que seja de forma legal, nada a dizer. Foi o que fez Soares dos Santos, como, aliás, grande parte das empresas que estão cotadas no principal índice da Euronext Lisboa. Tão portugueses e patriotas como os mais portugueses e patriotas, empresários e gestores como Paulo Azevedo, Zeinal Bava ou Vasco Mello têm sociedades ‘holding' na Holanda, um país com um regime fiscal não só competitivo, como estável, duas características que, como sabemos, não são propriamente regra em Portugal.
Aliás, este movimento, que deverá continuar durante o ano de 2012 depois de algumas alterações fiscais em sede de IRC, só mostra que o Governo está, nesta matéria, a seguir um mau caminho. E decisões como as de Soares dos Santos mostram que Portugal dificilmente será capaz de captar investimento estrangeiro ou de segurar as empresas portuguesas com esta política fiscal. O exemplo irlandês, aliás, deveria ser analisado com atenção, porque nem sempre as taxas mais elevadas resultam em mais impostos pagos.
Portanto, ao contrário do que afirma José Soares dos Santos, administrador executivo da Jerónimo Martins, em entrevista nesta edição, a primeira e mais importante razão para a escolha da Holanda não é o acesso a um novo mercado de capitais, é o pagamento de menos impostos do que pagaria em Portugal, hoje e no futuro. Porque, como diz o slogan do Pingo Doce, ‘sabe bem pagar tão pouco'.
A explicação, pueril, soa a falso e incomoda. Porque os contribuintes individuais e as pequenas e médias empresas não podem ir para a Holanda, mas têm de ouvir o patriarca da família Soares dos Santos e o segundo homem mais rico do País a dizer como é que se devem comportar para que Portugal saia da situação de emergência em que está. A criticar políticos, empresários, trabalhadores, as elites.
Alexandre Soares dos Santos criou riqueza e fez fortuna, o que legitima as suas opiniões. Mas não a superiodade moral que transporta em cada uma das suas intervenções. A decisão beneficia os accionistas da Jerónimo Martins, e bem, mas prejudica o País, e mal. É, também, por causa de decisões como esta, de actos que desmentem as palavras, que os portugueses não gostam dos ricos.
Estudo: Bruxelas revela desigualdades nos sacrifícios pedidos

Mais pobres suportam austeridade

São os mais pobres que estão a fazer mais sacrifícios para pagar a crise. A conclusão é de um estudo da Comissão Europeia que analisa a distribuição dos efeitos das medidas de austeridade por seis países em dificuldades: Portugal, Grécia, Espanha, Irlanda, Estónia e Reino Unido.
Por:lMiguel Alexandre Ganhão / Pedro H. Gonçalves / A.P.
As medidas de austeridade tomadas pelo Governo português, para além de estarem distribuídas de forma desigual entre ricos e pobres, fizeram subir o risco de pobreza, particularmente entre idosos e jovens.
O relatório de Bruxelas revela que Portugal "é o único país com uma distribuição claramente regressiva", ou seja, em que os pobres estão a pagar mais do que os ricos quando se aplica a austeridade. Exemplo disso é o rendimento disponível das famílias. Nos escalões mais pobres, o orçamento de uma família com crianças sofreu um corte de 9%, ao passo que uma família rica nas mesmas condições perdeu 3% do rendimento disponível.
Os dados mostram que Portugal é o único país analisado em que "a percentagem do corte [devido às medidas de austeridade] é maior nos dois escalões mais pobres da sociedade do que nos restantes". A Grécia, que tem tido repetidos pacotes de austeridade, apresenta uma maior equidade nos sacrifícios implementados.
Dos 3% do rendimento disponível que as medidas de austeridade vieram retirar aos portugueses, a fatia de leão é suportada por reformados e por pensionistas, seguindo-se o aumento dos impostos, que é suportado essencialmente pela classe média, e os cortes nos salários e subsídios dos funcionários públicos respondem pelo resto.
Uma situação que coloca a classe média sob pressão e faz subir o risco de pobreza de 18,5% para 20,5% da população.
ALEMANHA APOIA CORTES VIOLENTOS EM ESPANHA
O governo alemão deixou ontem elogios às medidas de austeridade aplicadas pelo novo executivo espanhol de Mariano Rajoy.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Guido Westerwelle, manifestou o "grande respeito" do executivo de Angela Merkel pela decisão que "envolve cortes dolorosos e inevitáveis". Westerwelle diz que "o facto de Espanha não cumprir o défice de 6% em 2011 mostra que tem necessidade de um processo consistente de consolidação".
GRÉCIA EXIGE NOVO RESGATE OU SAI DO EURO
O Governo grego avisou ontem que o país pode ser forçado a deixar a Zona Euro caso não chegue a acordo com o BCE e o FMI para um novo plano de resgate financeiro, depois da primeira ajuda de 130 mil milhões de euros, em Outubro. "Este segundo acordo de empréstimo deverá ser assinado. Caso contrário, estaremos fora dos mercados e fora do euro", declarou um porta-voz da equipa de Lucas Papademos, que inicia as negociações este mês.
"RICOS TÊM OBRIGAÇÃO DE CONTRIBUIR MAIS"
Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas, não se mostrou surpreendido com as conclusões do relatório da Comissão Europeia, que aponta Portugal como o país onde as medidas de austeridade foram mais exigentes para os mais pobres.
"Só confirma o que temos vindo a alertar nos últimos anos. A riqueza está na mão de poucos, e a maioria, que contribui para a criação dessa riqueza, vive uma situação de injustiça gritante", comentou ao CM, reclamando ao Governo medidas para inverter a situação: "Os ricos têm obrigação de contribuir mais para a solução da crise."
Para o presidente da Cáritas, a injustiça é ainda maior porque "algumas riquezas foram obtidas de uma forma pouco clara".
Recuperando os últimos dados sobre a pobreza na Europa, Eugénio Fonseca lamentou ainda que "Portugal já seja o país com maiores assimetrias entre ricos e pobres".
A situação em Portugal, acrescentou, é dramática, e contesta que apenas 20% da população esteja em risco de pobreza. "Não há estatística que resista ao que está a acontecer. De 2005 a 2008, passámos de 20% para 17,8% da população em risco porque o Estado fez mais transferências sociais. Se não fosse o Estado Social, esse número seria de 43%", referiu, contrariando a Comissão Europeia: "Diz que passámos a barreira dos 20%, mas somos muito mais."
330 MIL COM AJUDA PARA COMER
O Banco Alimentar Contra a Fome recolheu 2950 toneladas de alimentos na última campanha, realizada em Novembro do ano passado. Os géneros alimentares começaram de imediato a ser distribuídos a mais de duas mil Instituições de Solidariedade Social, que os entregam a cerca de 330 mil pessoas com carências alimentares comprovadas. Segundo o Banco Alimentar Contra a Fome, foram distribuídas ao longo de 2010 cerca de 26 567 toneladas de alimentos.

3.1.12

Sócrates faria um OE muito diferente?

Por Ana Sá Lopes


Este Orçamento seria abençoado por muitos se a assinatura fosse de Sócrates

À excepção de Fonseca Ferreira (residual), de António José Seguro (activo nos bastidores mas silencioso em público) e de Manuel Alegre (que oscilou entre uma grande violência verbal que foi extinta quando se tornou candidato oficial às presidenciais) o PS de Sócrates funcionava numa espécie de ditadura em que o iluminado apenas se aconselhava com três pessoas.
O secretariado nacional, o órgão de direcção do partido, tornou-se uma aberração – pura e simplesmente não reunia, não existia e só não foi declarado extinto em nome da História e memória, talvez.
Com a excepção da derrota das europeias de 2009 – onde houve de facto contestação ao rumo das políticas – as restantes reuniões da Comissão Política se não estavam ao nível de um encontro de ex-alunos, estavam lá perto. Havia as tais excepções, mais Ana Gomes e pouco mais.
Sócrates não se podia afrontar porque não se podia afrontar. Muito poucos socialistas ousaram falar fora da linha que era definida pelo secretário-geral cada vez mais refugiado dentro de uma bolha, a bolha da sua cabeça omnipotente. O domínio de Sócrates sobre o PS foi provavelmente mais obsessivo do que o domínio de Cavaco Silva sobre o PSD – e Cavaco Silva não foi um menino de escola nesta matéria.
É importante lembrar a história mais-do-que- -recente quando, agora, a maioria dos defensores do envio do Orçamento do Estado para o Tribunal Constitucional à revelia do secretário-geral, estão precisamente aqueles que assinavam tudo o que Sócrates dizia, por baixo e sem um suspiro de dúvida.
Um partido que se absteve relativamente ao Orçamento do Estado para 2012 não pode ter dúvidas constitucionais sérias. Se este orçamento fosse apresentado por José Sócrates – e foi Sócrates que assinou o acordo da troika que obriga a metas inconcebíveis – a maioria destes subscritores lamentaria profundamente, ficaria ao lado do chefe com o supremo argumento de que por causa do memorando da troika não haveria nada a fazer.
O que é desagradável nesta manobra para obrigar o Tribunal Constitucional a declarar a constitucionalidade do orçamento é que ela não se destina a atingir o governo – o alvo directo é António José Seguro, que vai gerindo com extremas dificuldades o compromisso entre estar ao lado da troika e, ao mesmo tempo, distante. A tentativa de quadratura do círculo, nestas circunstâncias, é impossível. Seguro tem duas opções: manter-se na oposição sem poder, aprovando tudo, acossado por quem assinava o orçamento se a ordem fosse de Sócrates e ficando inelutavelmente ligado à austeridade. A outra opção é aceitar entrar numa coligação, com poder. Nenhuma das opções é boa, mas os riscos já são equivalentes.

2.1.12



Do fogo e das cinzas



Nove paquetes de cruzeiro com cerca de 15 mil turistas terá sido o saldo do espectáculo de fogo de artifício de 736 mil euros organizado por Jardim no final do ano.
A factura do foguetório foi integralmente paga pelo Governo Regional, isto é, pelos contribuintes do Cont'nente. Dando de barato que todos esses turistas tenham chegado a desembarcar, terão deixado em restaurantes e lojas de bugigangas do Funchal algo como 750 mil euros, o que, em miúdos, significa que 736 mil euros dos contribuintes passaram (essa, sim, a "passagem do ano"!) para as mãos dos comerciantes do Funchal através das vastas mãos de Jardim, acrescidos de uns trocos de turistas. Juntem-se agora mais 2 milhões de euros na "iluminação" das ruas dos restaurantes e lojas de bugigangas (adjudicada sem concurso à empresa de um ex-deputado do PSD e também paga pelos contribuintes), e calcule-se - é só fazer as contas, como dizia o outro - quem ganhou o quê e quem ficou de novo a arder com uns milhões.
Não seria mais rentável a Madeira dedicar-se, por exemplo, ao turismo de congressos e partilha de experiências de sucesso? Eis temas (mas haverá muitos mais) capazes de atrair ao Funchal multidões de jovens políticos de elevado potencial de todo o Mundo: "Como passar o ano em folguedos por conta de 10 milhões de otários insultando-os todos os dias" ou "Como transformar sifões em cifrões escolhendo os amigos certos no partido certo".