7.2.09
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O Marcelo no incursões
Au Bonheur des Dames 171
Abram alas! Passa o Malho!
Chapeau bas! Viva o pimpolho!
E é tratar de abrir o olho,
Porque ele vem de chanfalho.
Lembram-se do Joãozinho das Perdizes? Se calhar não... já ninguém lê Júlio Dinis, escritor malogrado, morto demasiado cedo para poder ser conhecido por mais alguma coisa do que “A morgadinha dos canaviais”, “Uma família inglesa” ou as eternas pupilas.
Se as leitoras se derem ao trabalho verificarão, contudo, que JD pintou como nenhum outro a mudança social e política. Foi um cronista do fontismo ou pelo menos da vontade de mudar o país. E em “Os fidalgos da casa mourisca” mostra como a decadente aristocracia rural começa a ser substituída pelos empresários agrícolas que em breve os substituirão.
O Joãozinho, pitoresca criação sua, era um reaccionário de bom coração que varria feiras a varapau. Malhava forte e feio nos adversários, fiado na sua força, na sua classe e no punhado de apaniguados que lhe deviam obediência. E gabava-se disso.
Do que ele gostava era de malhar na esquerda, se por isso pudermos significar os arautos de um Portugal que tentava emergir do espesso mundo rural nortenho.
Parece que esta fúria de varapau atacou agora o dr. Santos Silva. Endoidou-o a pontos de o fazer confessar essa pulsão pauliteira à boca de um microfone, perante um auditório regougante. A ocasião presta-se a estas bravatas à velha moda de Fafe: o líder é atacado e a melhor defesa é varapau nos que aparecem. Enquanto o marmeleiro vai e vem, folgam os fripóres...
Não deixa de ter graça, o dr. Santos Silva apontar o trabuco à “esquerda chique” presumindo-se que isso significará o Bloco onde, como ele estará lembrado, ainda há um par de antigos trotskistas, com quem fez nos anos de juventude algum caminho.
S.S., com o seu tom de Vichinsky, com um toque de Jdanov, mete tudo no mesmo saco, oposições e críticos internos, e afinfa tonitruante com a promessa de “malha” em que se opuser. Nem nisto é original. Já o camarada Coelho, agora travestido em empresário, ameaçava nos bons tempos que “quem se mete com o P.S. apanha”. Não parece que essa premonição de Coelho tenha tido ganho de causa mas já ninguém se lembra dessa fanfarronada. Nem de Coelho, acolhido agora ao eremitério de uma sinecura aprazível e bem paga. Não é único ex-dirigente do P.S. a poder gozar os benefícios de uma “retraite dorée”, que os exemplos abundam. Chega-se a pensar que há quem só queira chegar a altos cargos partidários, políticos e governamentais para rapidamente “passar à peluda” no seio de uma empresa generosa e grata. E que pague bem, convém acrescentar. Que pague muito bem, que ainda há.
O Joãozinho das Perdizes, no romance daquele que poderia eventualmente ter sido uma espécie de Balzac português, acabou por se retirar das lides façanhudas e acatar a nova ordem. Já não recordo como se converteu à nova economia e que destino lhe dá Júlio Dinis. Nem isso interessa. Este joãozinho é apenas lembrado por um velho e inútil cronista, perdido num blog entre tantos outros para provação de escassas mas gentis leitoras que lhe aturam os humores bilioso e colérico. Ou, por outras palavras, não ficou na história. E os seus modernos clones deste século XXI e português também não.
6.2.09
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Mercado laboral. Independentemente do êxito do Governo na inserção de pessoas à margem do mercado de trabalho, as medidas anunciadas têm o efeito imediato de reduzir o número oficial de desempregados INE exige três condições ao conceito de desempregadoSe for aplicado integralmente, o plano (…)
5.2.09
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Foguetes & facturas
Fico a saber pelo "Jornal de Negócios" que uma parte do preço das portagens que pago quando circulo numa auto-estrada se destina a pagar o "evento" de assinatura do contrato de concessão, durante o qual, diante das câmaras de TV, bota discurso um sempre luzido cortejo governamental. A coisa custa-me, e aos restantes cidadãos e empresas que usam auto-estradas, 500 mil euros de cada vez (além do penoso custo de ter que ouvir os discursos).
As concessionárias são, de facto, por cada concessão, obrigadas a entregar, sem regatear, 500 mil euros a "fornecedores" indicados pela Estradas de Portugal, que, depois, se reúnem no Ministério das Obras Públicas para preparar o "acontecimento" sob orientação de um ex-apresentador de TV expressamente contratado para "organizar eventos" (na vulgata propagandística, "números").
Já o custo do "evento", ou "número", de apresentação do relatório que afinal não era da OCDE não se sabe quanto terá custado. A única coisa que se sabe é quem pagará a conta… (A propósito: não se esqueça de que o prazo de entrega das declarações Modelo 3 do IRS termina daqui a um mês).
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Leis da selva
Cavaco Silva vem manifestando, de forma reiterada, a sua preocupação com a má legislação que se produz em Portugal. É claro que se as leis não têm qualidade, falta de qualidade terá também quem as produz, ou seja, o Parlamento. Este deveria ser o coração da democracia, mas parece ser hoje um seu apêndice. Não cumpre o papel que lhe está constitucionalmente atribuído e transformou-se numa central de negócios, ao serviço de quem domina os directórios partidários.
O Parlamento deveria cumprir duas missões estratégicas fundamentais: produzir legislação de qualidade, que estruturasse a vida política, social e económica do país, por um lado; e, por outro, fiscalizar a acção governativa. Sucede que não cumpre nem uma nem outra.
Da Assembleia da República emana muita e má legislação, a um ritmo alucinante. A produção legislativa é, em regra, suscitada por questões casuísticas e não corresponde a uma visão sistémica do país. Invariavelmente, as leis têm muitas normas, muitas excepções e um quase ilimitado poder discricionário. Com as excepções, favorecem-se os amigos e a discricionaridade constitui o melhor estímulo à corrupção.
A Assembleia da República não tem também qualquer capacidade de fiscalizar o Governo. Muito pelo contrário, é o Governo que controla o Parlamento, através dos deputados do partido do Poder. Nos restantes partidos, os parlamentares são também meros joguetes dos directórios partidários. Como estes são dominados por poderosos grupos económicos, a sede da democracia portuguesa transformou-se numa delegação da megacentral de negócios em que se converteu a vida política nacional. Os senhores deputados andam, pois, a tratar de vida; da sua e daqueles a quem devem obediência. Estão, na sua larga maioria, ligados a grandes grupos empresariais. Muitos deles estão associados aos grandes escritórios de advogados que dominam o circuito legislativo em Portugal. Chegam mesmo a utilizar o Parlamento como delegação do seu próprio escritório, tendo em vista o acesso aos meandros do Poder que o cargo lhes permite.
São poucas as honrosas excepções, os que podem orgulhar-se da nobreza da função de deputado. Sentem-se sufocados neste sistema e acabam por abandonar a vida parlamentar.
De facto, Cavaco Silva tem razão. As leis são más, porque procedem dum Parlamento incapaz. Concordo em absoluto com o diagnóstico. Cabe ao presidente aplicar a terapêutica.