5.2.09

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Leis da selva

Cavaco Silva vem manifestando, de forma reiterada, a sua preocupação com a má legislação que se produz em Portugal. É claro que se as leis não têm qualidade, falta de qualidade terá também quem as produz, ou seja, o Parlamento. Este deveria ser o coração da democracia, mas parece ser hoje um seu apêndice. Não cumpre o papel que lhe está constitucionalmente atribuído e transformou-se numa central de negócios, ao serviço de quem domina os directórios partidários.

O Parlamento deveria cumprir duas missões estratégicas fundamentais: produzir legislação de qualidade, que estruturasse a vida política, social e económica do país, por um lado; e, por outro, fiscalizar a acção governativa. Sucede que não cumpre nem uma nem outra.

Da Assembleia da República emana muita e má legislação, a um ritmo alucinante. A produção legislativa é, em regra, suscitada por questões casuísticas e não corresponde a uma visão sistémica do país. Invariavelmente, as leis têm muitas normas, muitas excepções e um quase ilimitado poder discricionário. Com as excepções, favorecem-se os amigos e a discricionaridade constitui o melhor estímulo à corrupção.

A Assembleia da República não tem também qualquer capacidade de fiscalizar o Governo. Muito pelo contrário, é o Governo que controla o Parlamento, através dos deputados do partido do Poder. Nos restantes partidos, os parlamentares são também meros joguetes dos directórios partidários. Como estes são dominados por poderosos grupos económicos, a sede da democracia portuguesa transformou-se numa delegação da megacentral de negócios em que se converteu a vida política nacional. Os senhores deputados andam, pois, a tratar de vida; da sua e daqueles a quem devem obediência. Estão, na sua larga maioria, ligados a grandes grupos empresariais. Muitos deles estão associados aos grandes escritórios de advogados que dominam o circuito legislativo em Portugal. Chegam mesmo a utilizar o Parlamento como delegação do seu próprio escritório, tendo em vista o acesso aos meandros do Poder que o cargo lhes permite.

São poucas as honrosas excepções, os que podem orgulhar-se da nobreza da função de deputado. Sentem-se sufocados neste sistema e acabam por abandonar a vida parlamentar.

De facto, Cavaco Silva tem razão. As leis são más, porque procedem dum Parlamento incapaz. Concordo em absoluto com o diagnóstico. Cabe ao presidente aplicar a terapêutica.

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