23.12.11



Uma democracia "com falhas"



Portugal deixou em 2011 de ser uma democracia plena, de acordo com o Índice da Democracia 2011 do Economist Intelligence Unit, que classifica o país como "democracia com falhas". Segundo o serviço de investigação de "The Economist", isso deveu-se, sobretudo, à erosão da soberania associada à crise da zona euro.
É mais um título, o de coveiros da democracia, de que podem orgulhar-se PSD, CDS e PS, subscritores do memorando com a 'troika', e o Governo de Passos Coelho, que o põe submissamente em prática contra os portugueses sem o mínimo rebate de autonomia ou patriotismo.
A venda da soberania nacional aos 'mercados', a troco de uma 'ajuda' a prestações dependentes do bom e obediente comportamento dos seus feitores locais, teria que ter consequências sobre o regime democrático pois não é possível governar contra os interesses dos povos sem amordaçar as liberdades civis.
E a procissão ainda vai no adro. Não se sabe se "The Economist" já teve em conta o comportamento da PSP durante a manifestação de 24 de Novembro e as ameaçadoras declarações do seu director nacional ("Nós não andamos com bastões, nem com pistolas, nem com algemas, nem com escudos e etc. para mostrar que temos aquele equipamento"). Certo é que, entre outras "falhas", ainda não considerou - pois, para já, foi travada pela CNPD - a intenção do Governo de polvilhar cidades e florestas com câmaras vídeo por simples decisão administrativa.

22.12.11

Tribunal de Contas. Despesa com dívida ficou 23 mil milhões acima do previsto

Por Filipe Paiva Cardoso

Em 2010, a despesa com amortizações, juros e outros encargos da dívida pública atingiu 119 mil milhões, contra os 96 mil milhões previstos. Opção pelo curto prazo sai cara

“A previsão inicial dos fluxos financeiros associados à emissão e à gestão da dívida pública directa subestimou, significativamente, as receitas e as despesas em causa, em particular as últimas.” A conclusão é do Tribunal de Contas (TdC), no parecer à Conta Geral do Estado de 2010, divulgado esta semana pelo órgão constitucionalmente responsável pela fiscalização da despesa pública e pela avaliação das contas.
Com o aumento das necessidades de financiamento do Estado durante o ano passado – que levou a um encaixe para as contas públicas de 131,9 mil milhões de euros, contra os 118,12 mil milhões previstos, entre nova dívida e renovação de dívida –, veio também um aumento nos custos suportados pelos contribuintes com encargos da dívida e amortizações. “A despesa prevista com o pagamento de amortizações e de juros e outros encargos da dívida pública directa era de 90 538 milhões de euros e 5519 milhões de euros, respectivamente, ascendendo a execução orçamental a 114 746 milhões e 4979 milhões, isto é, 56,5% e 2,5% do total da despesa executada pela administração central”, explica o TdC. Do final de 2009 para o final de 2010, o stock de dívida pública directa cresceu 19 mil milhões de euros (14,3%), para mais de 151 mil milhões.
Segundo os valores publicados no parecer às contas do ano passado, as emissões de dívida pública a curto prazo deram um salto de 12,3% – mais 2,8 mil milhões, para 25 mil milhões –, tendo sido outra a razão que fez disparar a despesa prevista com a gestão da dívida. Em 2009, por exemplo, e segundo o parecer relativo às contas desse ano, a despesa pública com a dívida recuou 14,5 mil milhões graças ao reforço da aposta na dívida a longo prazo. A preferência acabou em 2010, assim como em 2011 – até à entrada do FMI.
Ao longo da análise à gestão da dívida financeira do Estado durante 2010, o Tribunal de Contas lembra a este propósito que o Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público (IGCP) toma as decisões relativas a montantes, maturidades ou formas de colocação de dívidas respondendo a “um quadro de limites e regras determinados pela Assembleia da República e pelo governo”. No ano passado tal não se verificou: “Não foi isso que sucedeu em 2010, uma vez que, confrontado com um agravamento acentuado da falta de liquidez no mercado da dívida pública [...] o governo aprovou a 7 de Maio de 2010 a suspensão temporária da carteira de referência e de determinados limites fixados nas Orientações, tendo em conta a necessidade de intensificar o uso de fontes de financiamento alternativas de curto prazo.” O temporário acabou por se tornar definitivo numa nova ordem de Outubro emanada do Ministério das Finanças, então a cargo de Teixeira do Santos.
IGCP COBRA DEMASIADO O ano passado o IGCP cobrou ao Estado 13,25 milhões de euros a título de “comissão de gestão” da dívida pública, valor considerado exagerado pelo Tribunal de Contas. Os Estatutos do IGCP determinam que as comissões são fixadas anualmente pelas Finanças – entre 0,01‰ e 0,15‰ do valor da dívida directa do Estado no final do ano anterior. Esta forma de cálculo “tem merecido reservas por parte do Tribunal de Contas. Quanto ao valor, porque o instituto tem efectuado anualmente reposições significativas do montante não utilizado, o que demonstra que é desajustada a forma como esta comissão é fixada, atentas as necessidades financeiras do IGCP”.



O ministro de Tudo



O ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, tem vindo progressivamente a assumir-se como o ministro de Tudo e Mais Alguma Coisa. Poderia pensar-se que sofreria da voraz síndroma "cheliomyrmex andicola", também dita síndroma da marabunta; mas não: o próprio Passos Coelho nele delegou, satisfazendo o seu insaciável apetite político, competências em áreas tão dispersas quanto as da igualdade de género, administração local, desporto, diálogo intercultural ou juventude, permitindo-lhe igualmente atribuir subsídios, condecorações, pensões por serviços excepcionais e relevantes e, até, a "pensão por méritos excepcionais na defesa da liberdade e da democracia", matéria em que o ministro Relvas exibe, como se sabe, invejável currículo.
Para além disso, falando Passos Coelho frequentemente por parábolas, a Miguel Relvas cabe ainda a interpretação autêntica das suas palavras. Assim, já veio explicitar que os portugueses que sigam o conselho do primeiro-ministro e emigrem rapidamente e em força para Angola ou Brasil (Relvas acrescenta Moçambique) aí encontrarão o Eldorado, pois"os portugueses [que] têm uma visão universalista têm sempre sucesso".
A emigração de jovens "portugueses com formação superior" para esses países deve porém ser, frisa Paulo Rangel, uma "segunda solução". A primeira é, obviamente, tentar emigrar para o PSD e, daí, para um "job" num instituto ou numa empresa pública.

21.12.11

Carro de autarca custa 70 mil euros

Guilherme Pinto, presidente da Câmara de Matosinhos, pagou 70 mil euros pelo aluguer de um carro de alta cilindrada, ao volante do qual deverá circular nos próximos três anos. Cinco vereadores da câmara tiveram também direito a viaturas novas com diversos extras incluídos, entre os quais leitor de mp3. No total a autarquia vai gastar 200 mil euros nos potentes carros.
Por:Ana Isabel Fonseca/Tânia Laranjo
A adjudicação dos contratos de aluguer a uma empresa de automóveis foi apenas ontem anunciada. A oposição ficou chocada.
"Eu também queria comprar um avião, mas infelizmente não posso. E o Guilherme Pinto devia ter em atenção que este dinheiro não é dele e deveria aplicá-lo de forma mais assertiva", disse ontem ao CM Pedro Vinha da Costa, presidente do PSD Matosinhos.
O valor dos carros pode, no entanto, aumentar. Aqueles têm quilometragem limitada. Se for ultrapassada antes dos três anos, a Câmara de Matosinhos terá de entregar uma nova quantia.
No concurso, Guilherme Pinto fazia várias exigências. O seu carro teria de ter um motor de 3 mil cc e uma série de extras. Os cinco vereadores pediam para além de acessórios que a viaturas tivessem um leitor de mp3. O motor por seu turno era de 2500 cc.
"É uma falta de moralidade gastar quase 200 mil euros em automóveis de alta cilindrada, numa altura em que a crise afecta o País", afirmou o Pedro Vinha da Costa.
Segurança Social: Dívidas prescritas automaticamente em 2010

Governo de Sócrates deixa escapar 1,4 mil milhões

O governo de José Sócrates deixou prescrever dívidas de 1435 milhões de euros à Segurança Social, maioritariamente através de procedimentos automáticos, "sem a formalização legalmente exigível e assentando em pressupostos inadequados", conclui o Parecer da Conta Geral do Estado relativo ao ano de 2010, entregue ontem pelo presidente do Tribunal de Contas na Assembleia da República. Os juízes do Tribunal de Contas têm grandes reservas quanto à legalidade dos procedimentos adoptados pela Segurança Social .
Por:Raquel Oliveira
As dúvidas que suscita a Conta Geral do Estado de 2010 estendem-se a muitas outras matérias, nomeadamente, a utilização benefícios fiscais, contabilizações de operações imobiliárias e de dívidas a fornece-dores de forma incorrecta. A despesa fiscal, por exemplo, "enferma de deficiências de apuramento e de erros de contabilização, estando manifestamente subvalorizada", acusam os juízes do TC.
E no que diz respeito à receita obtida em resultado do combate à fraude e à evasão fiscais, programa lançado pelo antigo ministro das Finanças Teixeira dos Santos, não foi sequer reportada à Conta Geral do Estado.
Os juízes dizem, inclusivamente, que não conseguiram "confirmar os valores globais da receita e da despesa inscritos, devido ao desrespeito de princípios orçamentais, ao incumprimento de disposições legais que regulam a execução e a contabilização de receitas".
Situações que, alertam os responsáveis pelo documento, "continuam a afectar o rigor e a transparência das Contas Públicas".
O Estado chegou ao final de 2010 com dívidas por fornecimentos de bens e serviços no valor de 2,5 mil milhões de euros, com a área da Saúde a ser responsável por 87,2 por cento desse valor.
SOBRETAXA 'TAPA' BURACO
A sobretaxa extraordinária aplicada pelo Governo aos subsídios de Natal deste ano (nos salários pagos em Novembro) ajudou a melhorar a cobrança da receita fiscal do Estado até ao mês passado. Os impostos cobrados aos trabalhadores dependentes (IRS) aumentaram 467,5 milhões de euros num mês. Também o IVA subiu ligeiramente, mas continua a dar sinais de abrandamento no consumo das famílias. A receita cresce 8,3% face ao mesmo período de 2010. O ISV, aplicado na compra dos carros novos, cai 21% em termos homólogos. A execução orçamental mostra que o défice do Estado se situa em 9,9 mil milhões, melhorando 3,4 mil milhões face a 2010.
DÉFICE NOS 4% SEM MAIS AUSTERIDADE
O ministro das Finanças, Vítor Gaspar, confirmou ontem que o défice este ano ficará na casa dos 4%, mas que sem as medidas extraordinárias tomadas ficaria acima de 8%. "O défice orçamental ficará com toda a probabilidade na casa dos 4%, bem abaixo dos 5,9%" estipulados com a troika, disse o ministro no Parlamento, onde rejeitou mais austeridade. Gaspar anunciou ainda um Orçamento rectificativo para 2012 devido ao fundo de pensões da Banca.



Um romance português



Capítulo I: Em 2004, o Governo português era, como hoje, resultado de uma coligação entre o PSD e o CDS. O primeiro-ministro era Durão Barroso; Paulo Portas era ministro da Defesa. O Governo negociou então com o consórcio alemão GSC, de que faz parte a Ferrostaal, a compra de dois-submarinos-dois para a Marinha, que custaram a módica quantia de 880 milhões, negócio que desde cedo levantou dúvidas.

Capítulo II: Ontem, um tribunal alemão condenou dois ex-executivos da Ferrostaal a dois anos de prisão e ao pagamento de elevadas coimas por suborno de funcionários públicos estrangeiros na venda dos submarinos. O tribunal deu como provado que a Ferrostaal subornou o ex-cônsul de Portugal em Munique, pagando-lhe 1,6 milhões de euros para que ele propiciasse "contactos com o Governo português".

Capítulo III: Em Portugal corre também no DCIAP, desde 2006, um processo sobre o negócio por indícios de tráfico de influências, financiamento partidário ilegal e corrupção. Em meados do ano, estava parado "por falta de meios". Fora-lhe atribuído um só magistrado, que acumulava com outros processos; as traduções da documentação enviada pelas autoridades alemãs continuavam por fazer; ainda não tinham sido nomeados os peritos necessários ao prosseguimento da investigação...

Final feliz: Durão Barroso é hoje presidente da Comissão Europeia e Paulo Portas voltou ao Governo e é agora ministro dos "Negócios Estrangeiros".

20.12.11

Segurança Social paga para mudar direcção

JOÃO PAULO COSTA

Santos Sousa, actual presidente da Câmara da Murtosa, eleito pelo PSD, deverá ser o novo director distrital de Aveiro da Segurança Social, substituindo Helena Terra, advogada e antiga deputada do PS, cuja comissão de serviço terminava em Março de 2013 e que, por isso, terá de ser indemnizada pelo Estado em dezenas de milhares de euros.

Santos Sousa não quis comentar a mudança, mas Helena Terra confirmou que recebeu do Conselho Directivo da Segurança Social a informação da cessação da comissão de serviço de três anos iniciada em Março de 2010. Questionada sobre a indemnização, Helena Terra apenas disse esperar que "seja cumprida a lei de acordo com o estado de direito em que vivemos". A lei prevê para este tipo de casos uma indemnização equivalente aos salários em falta até ao final da comissão de serviço (dezena e meia de meses). No caso de Helena Terra, dirigente superior de 1.º nível, directora distrital de um centro de Segurança Social de nível 2 (maiores só Lisboa e Porto), o vencimento ilíquido aproxima-se dos quatro mil euros mensais (mais de três mil líquidos), o que poderá corresponder a uma indemnização de 60 mil euros.

19.12.11

Opinião

Câmara de Matosinhos: posso comprar o Estádio do Mar?

 José Manuel Meirim





1. A 28 de Novembro, o Tribunal de Contas pronunciou-se sobre o processo de compra do Estádio do Mar. A Câmara Municipal de Matosinhos pretendia comprar esse estádio ao Leixões Sport Club pelo preço de €4.980.000,00, a pagar pela seguinte forma: €750.000,00 no acto da escritura pública de compra e venda, €30.000,00 em acções do Leixões Club Futebol SAD e o remanescente em 120 prestações, no valor de €35.000,00, a que acrescem os respectivos juros, a pagar até ao dia 8 do mês a que respeitam. O Tribunal recusou o visto à minuta do contrato, arguindo um significativo acervo de ilegalidades. Vejamos somente alguns dados do extenso processo.


2. Para o Tribunal, "a aquisição é apresentada como justificada nos graves problemas financeiros do Leixões Sport Clube, Futebol SAD e na possibilidade de o estádio de futebol poder a vir a ser vendido para satisfação dos credores, situação dita não compatível com "a implantação centenária do Leixões no concelho". "No fundo, a aquisição faz-se para resolver os graves problemas financeiros do Leixões Sport Club, proprietário do imóvel e do Leixões Sport Clube, Futebol SAD, que tem como objecto "a participação na modalidade de futebol, em competições desportivas de carácter profissional, a promoção e organização de espectáculos desportivos e o fomento ou desenvolvimento de actividades relacionadas com a prática desportiva profissionalizada da referida modalidade". Só depois de "resolvida a questão financeira do Leixões Sport Club e do Leixões Sport Clube, Futebol SAD [...] far-se-ão os estudos para se aferir das potencialidades de utilização do espaço, e isto sem prejuízo da utilização do estádio, em termos preferenciais, pelos mesmos, sobretudo da sua equipa de futebol profissional".


3. Conclui o Tribunal: o Leixões Sport Club recebe do erário público o valor da venda do imóvel onde se encontra o Estádio do Mar, resolvendo, assim, os graves problemas financeiros, quer próprios, quer da Leixões SAD e, desportivamente, nada se altera continuando a usufruir preferencialmente da utilização das instalações e, por seu lado, fica o Município despojado do valor da aquisição e com a responsabilidade de custear a manutenção do imóvel. Isto é, a pretendida aquisição do imóvel configura verdadeiramente um auxílio financeiro ao Leixões Sport Club e à Leixões Sport Clube, Futebol SAD.

4. Por outro lado existe, segundo o Tribunal, uma identidade perfeita entre a forma de pagamento pela aquisição do imóvel e o pagamento de dívidas ao IAPMEI, o que reforça a conclusão que se trata de um verdadeiro apoio financeiro para pagamento de dívidas. Apoio financeiro que se mostra proibido pelo n.º 2 do artigo 46.º da Lei n.º 5/2007 na medida em que a Leixões Sport Clube, Futebol SAD participa em competições desportivas de natureza profissional, designadamente na II Liga (Orangina). Frisa-se, ainda, que 40% do capital social da Leixões Sport Clube, Futebol SAD é detido por pessoas privadas singulares, as quais acabam por beneficiar indirectamente do apoio que o Município pretende dispensar.

5. Que pena, a recusa de visto. Era, sem dúvida, um bom negócio! josemeirim@gmail.com