26.12.09

1605


Estado das Coisas

Decisões de gaveta

É tecnicamente possível, em processo penal e, no decurso de uma investigação criminal, haver decisões de gaveta? É legalmente possível existirem, neste domínio, decisões de natureza administrativa?

Pela natureza do processo-crime e pelos valores constitucionais em jogo, naquilo que diz respeito à transparência e aos direitos fundamentais em colisão, a resposta só pode ser negativa.
As decisões de gaveta, que mais não são do que puras decisões administrativas, não suportadas pela existência de um processo-crime, são ilegais e violam normas do Código de Processo Penal. E é assim porque ser de gaveta é ser obscura, não ser transparente e não permitir a sua fiscalização por via de recurso. Esta é a regra seja qual for a condição social, económica, pública ou anónima do arguido visado.
Dizem as más-línguas que, a propósito do processo ‘Face Oculta’, foram proferidas decisões ambíguas, confusas e ao arrepio das normas legais. A ser verdadeira esta tese, quem assim agiu violou as leis criminais e a Constituição.
Mas digam-me que isto não é verdade, que se trata de uma fantasia. Então, não compete ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e ao Procurador-Geral da República garantir a legalidade e defender a transparência das decisões judiciais e as boas regras de funcionamento do Estado de Direito? Claro que sim!
As decisões referentes às escutas entre Sócrates e Vara têm o efeito, para a imagem e a dignidade da Justiça, de um verdadeiro tsunami. Não pela não divulgação pública das escutas que só têm relevância para o processo, por se tratar de matéria que não pode ser resgatada para fins de interesse político e para a luta partidária. Mas por falta de esclarecimento dos procedimentos adoptados nas várias decisões proferidas.
A revelação dos fundamentos das decisões não viola o segredo de justiça, nem a nulidade decretada que fulminou a validade das escutas. Esta exigível divulgação pública não implica a divulgação do teor das escutas. Divulgar os procedimentos processuais é reforçar a transparência das decisões judiciais e validar os alicerces da democracia.
Não quero saber o teor das conversas gravadas. O que pretendo é saber os fundamentos das decisões proferidas. Manter tudo neste limbo de escuridão é deixar que os ventos e a tempestade semeada pelo tsunami arrastem outros que nada fizeram para o estado a que isto chegou.
A Justiça perde em rigor, em clareza e em coragem.
Não há dúvidas mas muitas certezas. Se não foi instaurado qualquer inquérito então não é possível aplicar as regras do CPP.



Rui Rangel, Juiz Desembargador


25.12.09

1604

Notícias da cleptocracia













Corrupção
Horta e Oliveira Costa fizeram negócio que prejudicou CTT
Carlos Horta e Costa, ex-presidente dos CTT, é acusado de ter prejudicado a empresa em 2,7 milhões de euros num negócio com o BPN, no tempo de Oliveira Costa, avança a edição do SOL desta quinta-feira

O Ministério Público (MP) acusa o ex-presidente dos CTT, Carlos Horta e , de ter beneficiado em 2005 o grupo BPN, liderado por Oliveira Costa. Em causa está um contrato de mais de 20 milhões de euros, que foi assinado contra diversos pareceres dos serviços internos dos Correios.









É um dos casos em foco na acusação deduzida pelo MP no chamado ‘caso CTT’. A pressa em assinar o acordo com a Rentilusa (empresa do grupo BPN), quando a administração de Horta e Costa já sabia que iria ser substituída pelo novo Governo do PS, prejudicou os CTT em 2,7 milhões de euros e levou o MP a acusar o ex-presidente da empresa por crimes de administração danosa e de participação económica em negócio.
Tudo começou no final da primeira quinzena de Dezembro de 2004, quando José Oliveira Costa, presidente do BPN, fez chegar a Horta e Costa uma proposta para gerir a frota dos CTT – calculada em mais de 3000 viaturas – no regime de Aluguer Operacional de Veículos (AOV). Estava-se em período de pré-campanha para as eleições legislativas de 2005, depois da queda do Governo PSD-CDS, liderado por Santana Lopes.

24.12.09

1603








  O PS está numa encruzilhada, imobilizado desde as eleições.
O único movimento que se nota é no sentido de forçar novas eleições para, com a intensa vitimização que vai ensaiando - que não desmerece das melhores e que o camarada Narciso não enjeitaria - tentar reconquistar a maioria absoluta.
Duvido que haja legislativas a curto prazo, pelo menos antes das presidenciais; e duvido que se houvesse, o PS sob a batuta do «eng» conseguisse alcançá-la.

Mas o PS não precisa de eleições; precisa de redefinir objectivos que correspondam à sua matriz ideológica e histórica ( ! )

A verdade é que o «eng» em maioria absoluta governou à direita, fez a política da direita.
Privilegiou o capital financeiro contra os pequenos empresários, contra os particulares, contra os pequenos aforradores (lembram-se dos certificados de aforro e do triste fim que tiveram?).
Privilegiou a indústria da construção civil, as empresas do «regime» contra os sectores que criam riqueza e emprego.
Ele e a «tralha» que o rodeia trataram dos seus interesses, dos seus negócios e dos dos seus amigos e companheiros.

Fez uma inversão - no discurso e só no discurso - após o desaire das europeias.
Tivesse conseguido agora uma maioria absoluta e estaríamos de novo, não duvido, a navegar nas mais torpes águas da política de direita, na defesa dos interesses «amigos».

Mas o PS pode e deve ser alternativa.
É maioritário, assiste-lhe o direito de governar e pode indicar o primeiro ministro que entenda.
Pode e deve governar à esquerda, fazendo alianças pontuais com os partidos à sua esquerda.
Deve dessa maneira defender os interesses e direitos da sua base sociológica, dos mais desfavorecidos e desprotegidos, dos trabalhadores, dos desempregados, das pequenas empresas comerciais e industriais nacionais.
E, por uma vez - entre outras necessidades - fazer com que os bancos as seguradoras, em suma o capital, paguem os impostos que devem pagar.

É possível, é desejável  é urgente, é um imperativo nacional. E é de esquerda.

Há que correr com o «eng» e com a tralha de direita que o acompanha.

Vamos a isso.

Boas Festas.




1602





O cravo e a ferradura

Acaba de ser divulgada no "site" da AR a proposta de lei nº 7/XI/1ª do Governo, que "permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo" (gosto do pormenor do casamento "civil"), confirmando-se que fica afastada "clara e explicitamente (...) a admissibilidade legal da adopção (...) por pessoas casadas com cônjuge do mesmo sexo".

A restrição é um bom exemplo do cínico conceito de igualdade que Orwell sintetizou na fórmula "todos iguais, mas uns mais iguais que outros". O Governo parece, de facto, ter optado pela estratégia de "uma no cravo outra na ferradura": por um lado, protesta que quer "combater as situações de discriminação dos homossexuais"; por outro discrimina-os, com o duvidoso argumento de que a adopção "envolve os interesses de (...) uma criança à guarda do Estado" (ou, digo eu, da Igreja). Como se viu no processo Casa Pia e resulta do que se vai sabendo do que se passa em numerosas instituições católicas de acolhimento de crianças (e não, não é apenas na Irlanda), Estado e Igreja merecem mais confiança do que um casal de homossexuais pelo facto de se tratar de homossexuais.

23.12.09

1601


«...não é possível facultar certidões dos despachos proferidos pelo Procurador-Geral da República, uma vez que nos mesmos se encontram transcritas partes dos relatórios referentes às gravações em causa, já que não seria possível fundamentar os despachos sem referir o que foi escutado (no todo ou em parte);»



É a desculpa mais esfarrapada que tenho ouvido.
Toda a minha vida li decisões judicias - estão aliás muita publicadas nos sites dos tribunais - em que largos excertos, quer da identificação das partes quer até da matéria factual, são suprimidas para preservar a intimidade das pessoas.

Mas isso não convence o P.G.R.

Que para fazer uma «punheta» ao Sócrates inventou as decisões judiciais secretas.
Voltamos ao tempo da inquisição.


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1600





Afinal eram outros

A notícia vinha no JN e o título era prometedor: "MP acusa 59 por crimes de escravidão". De repente, a minha confiança na Justiça trepou por aí acima até ao deslumbramento. À segunda linha, porém, a frustração foi total. Afinal tratava-se de angariação de trabalhadores portugueses para quintas em Espanha - onde, pelos vistos, eram tratados como os "angariados do "Amistad" - e não de 59 patrões de hipermercados, que são boa e respeitável gente, que se limita a aplicar o novo Código do Trabalho com o louvável objectivo de "manter a estabilidade das empresas e os postos de trabalho" e não, como poderia pensar-se, por ganância. É assim que, em nome da ética empresarial e da responsabilidade social das empresas, pretendem aumentar o horário de trabalho dos seus trabalhadores de 40 para 60 horas por semana (qualquer coisa como 10 ou 12 horas por dia, conforme tenham um ou dois dias de folga), a troco de uns mais que generosos 470 euros por mês, isto é, quase 2 euros por hora. E não é que os trabalhadores, mais dados a coisas comezinhas como comer e vestir do que a questões éticas, não querem aceitar?

22.12.09

1599

Notícias da cleptocracia:






CONDENADO A PERDA DE MANDATO

Concelhia do PS 'solidária' com autarca da Sé do Porto





O presidente da concelhia do PS Porto manifestou à Lusa estar solidário com o autarca da junta de freguesia da Sé do Porto hoje condenado a perda de mandato pelo Tribunal de São João Novo


O Tribunal de São João Novo condenou hoje o presidente da Junta de Freguesia da Sé do Porto à perda de mandato por ter "abusado flagrantemente" do cargo que desempenha ao cometer um crime de peculato e dois de falsificação de documentos.


1598


Da esquizofrenia política

"Ninguém se iluda.
Em Matosinhos, não existe democracia.
PS e Narciso Miranda são farinha do mesmo saco, temos de procurar nestes quatro anos ser a alternativa para a nossa cidade.
Conhecemos os problemas do concelho e temos que saber dar as respostas que os matosinhenses precisam, as respostas do passado já não servem.
Temos que lutar contra os governantes viciados num tipo de poder que já não se usa, temos que lutar contra os tachos, e lutar contra o desemprego da população, e não pensar somente em nós."


Teor da intervenção do Dr. Vinha da Costa no jantar de natal do PSD, segundo o «Matosinhos Hoje»; e que deve corresponder ao efectivamente afirmado, dado quanto vem publicado na coluna de opinião do mesmo na mesma página do mesmo jornal.
Ora, não posso deixar de me questionar:

1 - «Em Matosinhos não existe democracia» - Creio tratar-se de alusão ao que se passa na Câmara e na forma de exercer o poder de quem ocupa os cargos autárquicos. Ora o PSD tem dois vereadores no executivo e vários eleitos na Assembleia. Também eles exercem o poder de forma não democrática? Colaboram com o despautério instalado? Violam, a meias com o Dr. Pinto, os direitos liberdades e garantias dos cidadãos? São também eles uns carrascos da democracia? E o Dr. Vinha tudo quanto faz é protestar em jantares? Não intervém de forma activa? Não instrui os militantes do seu partido para se afastarem do abismo? Não lhes retira a confiança política? Deixa que as coisas corram em ditadura?

2 - «PS e Narciso Miranda são farinha do mesmo saco» - Se são porque é que o PSD do Dr. Vinha optou por apoiar uma parte da farinha; e mantém esse apoio sustentando a parte da farinha que está no poder?

3 -«temos de procurar nestes quatro anos ser a alternativa para a nossa cidade» - Ora aí está todo um projecto de vida. o Dr. Vinha e o seu PSD vão ser alternativa à Câmara onde eles são poder executivo. São poder na Câmara e alternativa na rua.

4 - «as respostas do passado já não servem» - Se as respostas do passado são as que o Dr. Pinto tem para dar às necessidades dos munícipes então o Dr. Vinha está bem colocado para criar a alternativa e dar respostas modernas e desempoeiradas; tem no executivo os seus vereadores que darão as respostas do futuro.

5 - E já que está com o pé no ar, pela mesma via vai «lutar contra os governantes viciados num tipo de poder que já não se usa». O Dr. Pinto já está com as barbas a arder.

6 - Finalmente vai «lutar contra os tachos».

Ai Dr. Aguiar! Esta vai doer!


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20.12.09

1597

Notícias da Cleptocracia:






Relação confirma envolvimento de Ricardo Rodrigues com "gang internacional"

Por Maria José Oliveira
Tribunal da Relação rejeitou recurso do Ministério Público sobre processo-crime contra o jornalista Estêvão Gago da Câmara




O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu não levar a julgamento o jornalista Estêvão Gago da Câmara, acusado pelo Ministério Público (MP) de atentar contra a honra e consideração de Ricardo Rodrigues, vice-presidente da bancada parlamentar do PS. Num acórdão datado de finais de Setembro, os juízes da Relação negaram provimento ao recurso, confirmando a decisão de não-pronúncia feita pelo Tribunal de Ponta Delgada. Ao PÚBLICO, Rodrigues disse estar "conformado" com a sentença da primeira instância.
Entretanto, o deputado instaurou um processo cível contra Gago da Câmara, a SIC e a SIC/Notícias, devido a uma reportagem que o associava a um caso de pedofilia em São Miguel: pede uma indemnização de meio milhão de euros e um pedido de desculpas a ser transmitido nos noticiários ao longo de um dia inteiro.
Na sentença da Relação estava em causa um artigo de opinião, publicado no Açoriano Oriental a 8 de Janeiro de 2005, nas vésperas das legislativas. Nesse texto, o jornalista manifestava a sua perplexidade pelo facto de o ex-secretário Regional da Agricultura e Pescas encabeçar a lista de candidatos do PS pelo arquipélago.
Considerando que o Parlamento iria ter um deputado que "não deixou nunca de ser um "caso"", escrevia: "Rodrigues esteve envolvido com um gang internacional na qualidade de advogado, sócio e procurador de uma sociedade offshore registada algures num paraíso fiscal; advogado/sócio de uma mulher [Débora Raposo] que está foragida no estrangeiro, acusada de "ter dado o golpe" de centenas de milhar de contos à agência da CGD de Vila Franca do Campo". Por tudo isto, "não deveria nunca ter enveredado pela actividade política".
O texto mereceu o repúdio do socialista. Avançou com um processo judicial contra o jornalista, alegando que o artigo atentava contra a sua honra e consideração. Em Abril, o juiz do Tribunal de Ponta Delgada deliberou pela não-pronúncia do arguido, "em nome de uma imprensa que se quer robusta, desinibida e desassombrada". A Relação, pronunciando-se sobre a utilização da expressão gang, considerou que a palavra era "insultuosa e indelicada", mas estava "justificada em factos".
Os factos remontam a 2000, quando Rodrigues foi constituído arguido num processo sobre crimes de associação criminosa, infidelidade, burla qualificada e falsificação de documentos. Nesse ano, foram julgadas nove pessoas. A principal arguida, Débora Raposo, professora do ensino básico para a qual Rodrigues trabalhava como advogado, estava foragida. Foi localizada no Canadá, em 2000, numa investigação SIC/Expresso, mas só extraditada em 2007. Nesse ano, foi condenada a seis anos de prisão por burla qualificada e falsificação de documentos. O caso foi objecto de uma reportagem de Gago da Câmara no Expresso (Outubro de 2007).
O processo relativo a Rodrigues foi arquivado. No despacho do MP podia ler-se que, apesar das "dúvidas" sobre a sua contribuição "nas actividades subsequentes à burla levadas a cabo pelos principais arguidos", o advogado alegou "desconhecimento da actividade delituosa".
Esta decisão foi lida com "perplexidade" pelo juiz de primeira instância. Isto porque o MP dissera que Rodrigues "foi referenciado como tendo mantido contactos (...) com a arguida, principalmente em reuniões que foram organizadas tendo em vista dar aplicação a quantias ilicitamente apropriadas. (...) Resulta de forma exuberante que fez deslocações a fim de tratar de assuntos relacionados com as actividades da arguida, as quais eram tudo menos transparentes; viajou igualmente por diversas vezes para a Madeira e até mesmo para o estrangeiro, nomeadamente para a Suécia, ilha de Mann e Argentina a expensas da mesma, obviamente pagas com dinheiro obtido de actividades que eram tudo menos lícitas".
O juiz de instrução concluiu que a acusação de que Rodrigues se envolvera "com umgang internacional" tinha sustentação: "Ao mesmo tempo que [Raposo] se apresentava ao assistente na "humilde condição" de professora do Ensino Básico, e em vias de aposentação, mantinha uma suite e um escritório no hotel (...), contactos com pessoas alegadamente proeminentes na finança mundial (entre eles um tal Z, que prestava "serviços financeiros" a partir de Miami, e um Cardeal [sic] Ortodoxo, responsável de uma sociedade financeira)".
A Relação corroborou a sentença da primeira instância, notando que o artigo de opinião contribuiu para "a formação" de "juízo crítico". Ao PÚBLICO, o jornalista disse estar "satisfeito" com as decisões dos tribunais: "Os tribunais e a justiça funcionaram".