3.1.12

Sócrates faria um OE muito diferente?

Por Ana Sá Lopes


Este Orçamento seria abençoado por muitos se a assinatura fosse de Sócrates

À excepção de Fonseca Ferreira (residual), de António José Seguro (activo nos bastidores mas silencioso em público) e de Manuel Alegre (que oscilou entre uma grande violência verbal que foi extinta quando se tornou candidato oficial às presidenciais) o PS de Sócrates funcionava numa espécie de ditadura em que o iluminado apenas se aconselhava com três pessoas.
O secretariado nacional, o órgão de direcção do partido, tornou-se uma aberração – pura e simplesmente não reunia, não existia e só não foi declarado extinto em nome da História e memória, talvez.
Com a excepção da derrota das europeias de 2009 – onde houve de facto contestação ao rumo das políticas – as restantes reuniões da Comissão Política se não estavam ao nível de um encontro de ex-alunos, estavam lá perto. Havia as tais excepções, mais Ana Gomes e pouco mais.
Sócrates não se podia afrontar porque não se podia afrontar. Muito poucos socialistas ousaram falar fora da linha que era definida pelo secretário-geral cada vez mais refugiado dentro de uma bolha, a bolha da sua cabeça omnipotente. O domínio de Sócrates sobre o PS foi provavelmente mais obsessivo do que o domínio de Cavaco Silva sobre o PSD – e Cavaco Silva não foi um menino de escola nesta matéria.
É importante lembrar a história mais-do-que- -recente quando, agora, a maioria dos defensores do envio do Orçamento do Estado para o Tribunal Constitucional à revelia do secretário-geral, estão precisamente aqueles que assinavam tudo o que Sócrates dizia, por baixo e sem um suspiro de dúvida.
Um partido que se absteve relativamente ao Orçamento do Estado para 2012 não pode ter dúvidas constitucionais sérias. Se este orçamento fosse apresentado por José Sócrates – e foi Sócrates que assinou o acordo da troika que obriga a metas inconcebíveis – a maioria destes subscritores lamentaria profundamente, ficaria ao lado do chefe com o supremo argumento de que por causa do memorando da troika não haveria nada a fazer.
O que é desagradável nesta manobra para obrigar o Tribunal Constitucional a declarar a constitucionalidade do orçamento é que ela não se destina a atingir o governo – o alvo directo é António José Seguro, que vai gerindo com extremas dificuldades o compromisso entre estar ao lado da troika e, ao mesmo tempo, distante. A tentativa de quadratura do círculo, nestas circunstâncias, é impossível. Seguro tem duas opções: manter-se na oposição sem poder, aprovando tudo, acossado por quem assinava o orçamento se a ordem fosse de Sócrates e ficando inelutavelmente ligado à austeridade. A outra opção é aceitar entrar numa coligação, com poder. Nenhuma das opções é boa, mas os riscos já são equivalentes.

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