Sabe bem pagar tão pouco
António Costa
O senhor Alexandre Soares dos Santos decidiu deslocalizar uma sociedade que controla 56% do grupo Jerónimo Martins para a Holanda, uma espécie de paraíso fiscal das ‘holdings’ internacionais e que é, por isso, um captador líquido de investimento estrangeiro de cariz financeiro.
A decisão, absolutamente racional, não justifica reparos, não fosse Soares dos Santos um empresário que nos pede, em tom de lição moralista, para não desistirmos do País.
Qualquer contribuinte, seja empresa ou individual, toma as suas decisões com base em critérios de eficiência e eficácia, ou, dito de outro modo, escolhe a forma e o modelo que lhe permite pagar menos impostos. E, desde que seja de forma legal, nada a dizer. Foi o que fez Soares dos Santos, como, aliás, grande parte das empresas que estão cotadas no principal índice da Euronext Lisboa. Tão portugueses e patriotas como os mais portugueses e patriotas, empresários e gestores como Paulo Azevedo, Zeinal Bava ou Vasco Mello têm sociedades ‘holding' na Holanda, um país com um regime fiscal não só competitivo, como estável, duas características que, como sabemos, não são propriamente regra em Portugal.
Aliás, este movimento, que deverá continuar durante o ano de 2012 depois de algumas alterações fiscais em sede de IRC, só mostra que o Governo está, nesta matéria, a seguir um mau caminho. E decisões como as de Soares dos Santos mostram que Portugal dificilmente será capaz de captar investimento estrangeiro ou de segurar as empresas portuguesas com esta política fiscal. O exemplo irlandês, aliás, deveria ser analisado com atenção, porque nem sempre as taxas mais elevadas resultam em mais impostos pagos.
Portanto, ao contrário do que afirma José Soares dos Santos, administrador executivo da Jerónimo Martins, em entrevista nesta edição, a primeira e mais importante razão para a escolha da Holanda não é o acesso a um novo mercado de capitais, é o pagamento de menos impostos do que pagaria em Portugal, hoje e no futuro. Porque, como diz o slogan do Pingo Doce, ‘sabe bem pagar tão pouco'.
A explicação, pueril, soa a falso e incomoda. Porque os contribuintes individuais e as pequenas e médias empresas não podem ir para a Holanda, mas têm de ouvir o patriarca da família Soares dos Santos e o segundo homem mais rico do País a dizer como é que se devem comportar para que Portugal saia da situação de emergência em que está. A criticar políticos, empresários, trabalhadores, as elites.
Alexandre Soares dos Santos criou riqueza e fez fortuna, o que legitima as suas opiniões. Mas não a superiodade moral que transporta em cada uma das suas intervenções. A decisão beneficia os accionistas da Jerónimo Martins, e bem, mas prejudica o País, e mal. É, também, por causa de decisões como esta, de actos que desmentem as palavras, que os portugueses não gostam dos ricos.
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