A angústia da PT no momento do penálti
Pedro Santos Guerreiro - psg@negocios.pt
A negociação entre a Telefónica e a PT, que faz de conta que acabou, está suspensa pelos caprichos de um homem, José Sócrates. A desistência espanhola, simulada na sexta-feira à meia-noite, bastou para deixar os portugueses em aflição. Ninguém quer desfazer o negócio. Mas ninguém consegue cosê-lo.
A Telefónica cumpriu o prazo e, para espanto da administração da PT, não revalidou o prazo da proposta. Como César Alierta ainda não deu qualquer sinal do que se segue - uma guerra jurídica? Uma OPA hostil? Uma nova proposta? Nada?... -, a empresa portuguesa ficou desasada.
É por isso que o processo não fica por aqui. Se ficasse, todos perderiam. A Telefónica porque fora vencida e continuaria sem o seu problema brasileiro resolvido; os accionistas portugueses porque perderiam o melhor negócio das suas vidas (7,15 mil milhões de euros!); a imagem externa de Portugal porque afinal é um País tomba-mercados mas dependente deles; a administração da PT, desautorizada por um Governo e incapaz de deslindar um acordo que repusesse os contadores; e a própria PT, paralisada por um conflito insanável. Seria uma humilhação geral, todos juntos ao fundo.
A Portugal Telecom é hoje o guarda-redes do livro de Peter Handke, em angústia no momento do penálti. Com uma diferença: até à utilização da "golden share", o jogo decidir-se-ia nesse momento, a bola entrava ou não na baliza, um ganhava, o outro perdia. Mas o árbitro, José Sócrates, pegou na bola, mandando o jogo continuar. As negociações prosseguem mas a PT e Telefónica já não estão a negociar só entre si, mas também com o Governo português. (O Governo espanhol continua de fora, o que levou o "El País" a acusá-lo ontem de tibieza.)
A intersecção de tantos interesses é quase impossível. O equilíbrio é tão difícil que podem mandar vir físicos e matemáticos resolver esta abstracção (químicos não vale a pena - já não há química possível entre toda esta gente). Como é que 1) os accionistas recebem dinheiro, 2) a administração assegura que a empresa não fica menor ou igual, 3) a Telefónica compra a Vivo e 4) o Governo salva a face mantendo a PT no Brasil?
Há as alternativas impossíveis (como a PT comprar a Vivo), as muito difíceis (como fundir a Vivo com a operadora de rede fixa da Telefónica no Brasil) e as apenas difíceis (como negociar uma entrada da PT na Oi acordada em simultâneo com a venda da Vivo e sem que a compra seja tão cara que dilua o bom negócio da venda). Em todas elas, no entanto, o vértice é o Governo português. José Sócrates, o mesmo que permitiu o divórcio livre entre pessoas, não viabiliza esta separação nem com comum acordo.
As negociações vão prosseguir, agora, por ironia, por vontade e empenho do lado português. Depois de uma guerra bloqueada, a paz não produziu ainda qualquer solução. Mas o regresso à guerra será pior para as duas empresas, que entrariam num processo de auto-destruição de energia e de valor, que é naturalmente pior para a parte mais pequena e fraca: a PT.
Ao contrário do que Ricardo Salgado pediu, não será José Sócrates a desatar o nó que deu neste negócio. Tem de ser a administração da PT, assessorada pelo BES, a satisfazer os interesses das empresas e os desejos caprichosos de Sócrates que, como imperador, assiste da bancada ao circo, de que Alierta saiu agora. Escravos da vontade de Sócrates, Granadeiro, Zeinal, Mora ou Salgado têm de ganhar e dar espectáculo ao mesmo tempo: "Avé, Sócrates. Aqueles que vão morrer saúdam-te".
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