12.5.11

O Partido Sócrates e a defesa do estado social


Poupança não vai para exportadores

Descida da TSU ajuda grandes empresas e só dá mil euros às PME

Uma descida da taxa social única (TSU) em quatro pontos percentuais, como propõe o PSD para cumprir o acordo com a troika, beneficiará as grandes empresas.

Em média, cada uma das 900 grandes empresas nacionais pouparia cerca de 590 mil euros, enquanto as mais de 300 mil pequenas empresas ficariam com menos de mil euros anuais. E os sectores beneficiados não serão os exportadores.
São fáceis de fazer as contas que o PÚBLICO fez com base nas estatísticas das empresas de 2009 (as mais actuais), divulgadas pelo Instituto Nacional de Estatística. Mas pouco se fala do impacto da medida. 

O memorando de entendimento obriga o próximo Governo a incluir no Orçamento do Estado de 2012 uma "recalibragem do sistema fiscal" que reduza os custos de trabalho. Terá de se reduzir a TSU, mas ao mesmo tempo compensar a Segurança Social dessa perda de receita, seja por uma subida do IVA, de impostos sobre o consumo ou descida de despesa. Tudo para se conseguir uma baixa dos custos de trabalho.
Mas já está instalada a confusão, mesmo entre o PSD, que - como afirmou ao PÚBLICO o negociador Eduardo Catroga - foi o partido que sugeriu a ideia à troika, com a ajuda do ex-administrador do Banco de Portugal Abel Mateus e de "um técnico do Banco de Portugal". 

Indústria com 330 mil euros

Os dados apurados mostram que a poupança gerada com essa descida está longe de atingir os sectores ligadas à concorrência internacional. 
Um quinto dos 1,5 mil milhões de euros gerados - cerca de 330 mil euros - irá para a indústria transformadora. Mas não só o montante parece escasso para influenciar os preços externos como ainda fica aquém de outros sectores. Outro quinto ficará no comércio. Doze por cento na construção e quase 40 por cento em sectores como hotelaria e restauração, transportes, informação, consultoria ou saúde, entre outros. Depois, a distribuição entre empresas é fortemente assimétrica. À primeira vista, parece haver uma distribuição equilibrada das poupanças entre as mais pequenas e as maiores empresas. Isso porque a distribuição de pessoal se reparte de igual forma pelos diversos escalões de pessoal. 
Mas, olhando para o valor que cada empresa pouparia, o resultado é diferente. Pouco mais de 0,3 por cento das empresas ficaria com um terço dos 1,5 mil milhões de euros de poupanças. A esmagadora maioria das 350 mil empresas (87 por cento) teria de gerir entre si pouco mais de 280 milhões de euros. Menos de mil euros cada. 
São os níveis médios apurados suficientes para gerar um choque na competitividade externa? Parece que não. O que poderão fazer dois terços das empresas industriais nacionais (com menos de dez empregados), com uma poupança anual de 1750 euros? Reflectir-se-ão nos preços praticados? Pagará o salário de mais um estagiário? Cada uma das empresas com um quadro de pessoal entre 10 e 50 pessoas ficará - em termos médios - com mais 9500 euros anuais. Mas já as 250 empresas com mais de 250 trabalhadores vão gerir uma poupança de 240 mil euros. Mesmo assim, será suficiente? 
Será esta medida que vai revolucionar a estrutura empresarial alicerçada - como defende o economista João Ferreira do Amaral - em sectores não sujeitos à concorrência, empurrados para lá após 12 anos de um euro valorizado face ao valor do escudo? 
Álvaro Santos Pereira, um economista que integrou o movimento Mais Sociedade - um think tank que participou na elaboração do programa eleitoral do PSD - defende a vantagem de uma "substancial" desvalorização orçamental que levasse os agentes económicos a preferir os sectores em concorrência com o exterior. Mas, para isso, defende, era necessário uma quebra bem mais pronunciada da TSU. Na ordem dos 20 pontos percentuais, ou seja, bem longe da proposta do PSD, de quatro pontos. "Baixar a taxa social em um ou dois pontos percentuais não vale a pena e poderá até ser contraprodutivo". "Tentar fazê-lo a conta-gotas retiraria toda a força da medida", conclui. 
António Carlos Santos, fiscalista e que foi secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do primeiro Governo Guterres, é crítico em relação à eficácia da medida, não só pela dificuldade em encontrar receitas para compensar a Segurança Social, mas também pelo efeito prático."Para ser totalmente eficaz", declarou ao PÚBLICO, "haveria que garantir que a redução da taxa se repercutiria nos preços do produto, coisa que entre nós, a avaliar pelas reduções de IVA, não parece ser um dado adquirido". Foi o que se passou com a restauração, quando beneficiou da taxa intermédia.

PÚBLICO

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