A campanha do ruído
Helena Garrido
A campanha eleitoral que devia servir para todos - políticos e cidadãos - se prepararem para os tempos extremamente difíceis que aí vêm está transformada numa gritaria.
Todos gostaríamos muito de ouvir falar do futuro. Em vez disso, somos massacrados com o passado e com dissimulações do acordo de assistência financeira.
É lamentável, mas o partido que mais tem marcado o tom ruidoso e opaco deste início de campanha eleitoral é o PS. Sem outras propostas que não sejam mais do mesmo (como a aposta nas renováveis - que nos está a sair caríssima -, que, quem sabe um dia, serão viáveis), os socialistas ocupam o resto do tempo a perseguir as propostas dos outros, com marcação cerrada do PSD.
Compreende-se obviamente a táctica. O PS está totalmente dependente da energia, agressividade e combatividade do líder. Há seis anos no poder, acumulou, como já tinha acontecido com o PSD de Aníbal Cavaco Silva, um batalhão de dependentes de lugares nos gabinetes, no Parlamento, na Administração Pública e nas empresas públicas. Muitos não terão lugar no sector privado, muito menos em tempos de elevado desemprego e de maior exigência às empresas. E os que podem contribuir com ideias estão cansados e sem energia.
O caso da Taxa Social Única é um bom exemplo de desinformação.
Comecemos pelos factos.
Os dois documentos assinados que concretizam o acordo entre o PS, PSD e CDS/PP e a União Europeia e o FMIconsagram como objectivo a redução do custo do trabalho e o aumento da competitividade. O Memorando de Entendimento diz logo na primeira página, relativa à política orçamental para 2012, que o Orçamento do Estado do próximo ano "incluirá um reajustamento neutral do sistema fiscal", tendo em vista esse objectivo. E estabelece o próximo mês de Outubro como data para a apresentação da proposta.
Mais pormenorizado, o Memorando para as Políticas Económicas e Financeiras consagra que o aumento da competitividade vai envolver "uma redução significativa das contribuições para a Segurança Social suportada pelo empregador". As medidas para anular a redução da receita, afirma-se no documento, "podem incluir alterações na estrutura e nas taxas do IVA, cortes adicionais e permanentes nas despesas e subidas de outros impostos que não tenham efeitos adversos na competitividade".
E foi exactamente o que se acabou de ler que foi assinado pelos três partidos. Todos concordaram em baixar as contribuições para a segurança social, compensando a quebra de receitas com aumento de impostos ou redução de despesas. E todos se comprometeram a fazer isso já com efeitos em 2012. Para se ser ainda mais claro: no próximo ano, as contribuições para a segurança social pagas pelos empregadores serão mais baixas e isso terá de ser compensado com mais impostos ou menos gastos.
Como a subida de impostos, com especial relevo para o IVA, tem efeitos mais rápidos e seguros do que os cortes de despesa pública, devemos todos estar preparados para um aumento da carga fiscal.
O PSD tem sido mais claro do que o PS. Clarificou ontem que vai reestruturar o IVA, significando que alguns produtos de taxa reduzida ou intermédia vão passar para a taxa máxima. Evitou dizer a verdade dura e crua: a carga fiscal vai aumentar. Quem nada diz é o PS.
No mundo ideal, PS e PSD estariam já a preparar os portugueses para os tempos extremamente difíceis que vão viver, para que todos se começassem a prevenir. Em vez disso, ouvimos apenas ruído. Que só não é desinformação total porque o PSD se aproxima do que vai ser a realidade. Faltam menos de quatro semanas para a campanha eleitoral acabar. A realidade cairá em cima de nós sem dó nem piedade, em Junho.
Sem comentários:
Enviar um comentário