12.12.10

do modo de vida socretista

POLÉMICA

Governo convidou consultora de imagem para blindados

por VALENTINA MARCELINO


Uma das empresas convidadas para fornecerem os blindados à PSP produz 'marketing' e comunicação. A certificação para equipamento de defesa só veio depois do convite feito
Uma das empresas que o Governo convidou para participar no concurso dos seis blindados para a PSP é uma consultora de imagem, gestão e marketing, que só obteve certificação do Ministério da Defesa, para o exercício da actividade de indústria de armamento (bens e tecnologias militares) representar equipamentos militares, depois do convite feito.
A Central M- Consultadoria de Gestão e Marketing foi, segundo um comunicado do Governo Civil de Lisboa (GCL), uma das cinco empresas chamada a apresentar uma proposta, ao procedimento concursal, tendo em vista um ajuste directo de um milhão e oito mil euros (sem IVA). Mas, apesar de um dos pressupostos ser a certificação das empresas na área militar, a autorização da Central M para esse efeito só foi publicada em Diário da República (n.º 222, 2.ª série) a 16 de Novembro de 2010. Nesta data, aliás, o concurso estava já fechado.
"É a primeira vez que estou a ouvir isso", garantiu ao DN António Galamba, o governador civil. "O elenco de empresas a serem consultadas foi definido por representantes do GCL, da PSP e da Direcção-Geral de Infra-Estruturas e Equipamentos do Ministério da Administração Interna (MAI), sob proposta final da PSP", afiança. Contactada a PSP para esclarecer a situação não foi obtida resposta.
O MAI, que tem assumido a responsabilidade política do processo, diz que "é absolutamente falso que o Governo Civil tenha convidado uma empresa de comunicação e marketing para o procedimento dos blindados".
Por seu turno, um porta-voz da Central M confirmou ao DN que "apesar de ser representante de algumas marcas de material de defesa" a empresa só pediu a autorização necessária ao Ministério da Defesa, para "entrar neste concurso". Esta fonte explica que soube deste procedimento através das declarações, na altura, do ministro da Administração Interna. "Pedimos então ao Governo Civil para nos convidar", acrescenta o mesmo interlocutor. O convite "foi feito na semana de 26 a 29 de Outubro", recorda este responsável.
Apesar do contra-relógio a Central M acabou por nem sequer apresentar nenhuma proposta, o que, aliás, aconteceu com outras três convidadas (ver caixa ao lado). Apenas uma, a Milícia se candidatou ao negócio e viu adjudicado o fornecimento dos seis blindados a 15 de Novembro.
O DN contactou com altos responsáveis de todas estas empresas concorrentes, a Pinhol, a Lasi Electrónica e a Montagrex-Optatrex, todas credenciadas no ramo. Os motivos da desistências são comuns a todas: os prazos dados pelo Governo Civil para entregar as propostas (cerca de cinco dias) e para fornecer as viaturas (10 dias) era "impossível de cumprir no tipo de equipamento em causa".
O administrador da Pinhol, Luís Filipe Pinhol, que recentemente vendeu ao exército, 24 blindados HMMWV, disse ao DN que "com mais alguns dias era possível até apresentar uma boa proposta dentro do preço-base lançado, mas com o prazo definido era impossível". A Pinhol pretende avançar com um processo para tribunal (ver texto em baixo).
O especialista em Contratação Pública, Nuno Monteiro Dente, concorda que "pode haver neste processo matéria de contestação". Embora salvaguarde desconhecer "em detalhe o processo" sublinha que "os prazos são demasiado curtos". No seu entender "sem prejuízo de uma grande capacidade própria, eventualmente só quem tivesse o procedimento comercial já em curso poderia cumprir os prazos exigidos".
O DN tentou também contactar o director da Milícia para esclarecer como conseguiu cumprir os difíceis prazos, mas não obteve resposta até ao fecho da edição.
Para Nuno Monteiro Dente, que é co-autor do livro Código dos Contratos Públicos - Comentado, há ainda outra matéria neste processo que "é discutível". Trata-se do motivo invocado pelo Governo para proceder ao ajuste directo. Ao contrário do que se julgou inicialmente, que a razão era a urgência na aquisição dos equipamentos, supostamente para serem usados na Cimeira da NATO, o ajuste directo foi feito ao abrigo da norma legal que o admite quando o contrato em causa seja declarado "secreto ou a respectiva execução deva ser acompanhada de medidas especiais de segurança, bem como a defesa dos interesses essenciais do Estado o exigir".
Para Nuno Dente, "à partida, não é o caso destas viaturas, pois a publicitação das capacidades destas viaturas não põem em causa a segurança, antes pelo contrário, servem de dissuasão". A não ser que "no limite, considerem que o nível de protecção balística deva ser secreto ou que se tenham feito adaptações às viaturas que também tenham sido classificadas como secretas".
Estas questões vão ser analisadas pelo Tribunal de Contas, onde foi entregue o pedido de visto. E Rui Pereira vai terça-feira ao Parlamento dar explicações sobre a aquisição dos blindados.



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