24.11.09

1490

A apologia da ignorância

Por Pedro Lomba

Vital Moreira, que escreveu na última terça-feira neste jornal contra a "campanha de perseguição" que atribui aos que têm como único objectivo apurar na esfera política o conteúdo das conversas entre José Sócrates e Armando Vara, não pode ser o mesmo que há uns anos, quando o ex-ministro da Defesa Paulo Portas estava a ser sovado em público no caso da Universidade Moderna, publicou um texto intituladoResponsabilidade política.

Esse artigo de Vital Moreira, escrito em 2002, ajudava a perceber por que é legítimo transpor para o debate político o conteúdo de factos noticiados num inquérito criminal que suscitem um forte juízo de censura à honorabilidade e conduta de um membro do Governo. Responsabilidade política e responsabilidade criminal, explicava o jurista, não se excluem nem se confundem, envolvendo juízos de censura e procedimentos institucionais distintos.

Paulo Portas nunca foi arguido no caso da Universidade Moderna, que dizia até respeito a factos anteriores ao exercício das suas funções, mas era ministro. Mas esse ponto não impediu muitos como Vital Moreira de apelar ruidosamente à responsabilização e condenação política do ex-ministro. Aquilo que está agora em debate não tem comparação, visto que se trata do esclarecimento devido pelo primeiro-ministro sobre o tema mais controverso da sua governação: a interferência na independência da comunicação social. Mas Vital Moreira, agora do lado do Governo, esqueceu-se de aplicar a mesma grelha de valores por puras razões de afinidade política.

Convém por isso insistir: se um primeiro-ministro, reeleito há dois meses, utilizou o poder do Estado para interferir na independência da comunicação social, punindo grupos de media que publicam notícias que lhe são desfavoráveis e protegendo outros que papagueiam a mensagem governamental, tem de esclarecer tudo o que tiver resultado de conversas acidentais com suspeitos objecto de escutas "irritantemente válidas", como disse Costa Andrade no PÚBLICO de quarta-feira.

Certamente que as fugas de informação são crime: investiguem-se e sancionem-se os responsáveis. É essa a resposta institucional que lhes deve ser dada. Se for necessário, reforme-se o sistema. Já os sinais de conduta irregular do primeiro-ministro devem gerar os procedimentos de responsabilidade política perante os órgãos que o fiscalizam: o Parlamento e o Presidente. A necessidade de esclarecimento dessas declarações é ainda reforçada pela circunstância de que a última campanha eleitoral ficou marcada pela publicação pelo DN do famoso email do PÚBLICO no caso das escutas ao Presidente e pelo cancelamento do Jornal Nacional da TVI.

Muitos, incluindo o próprio Vital Moreira, pretendem convencer-nos de que é inaceitável, perigoso e mesmo "imoral" responsabilizar politicamente José Sócrates. Vale então a pena reler aquilo que ele escreveu em 2002:

"Existe uma separação entre o foro judicial e o foro político, mas nada impede uma acusação (e eventual condenação) na ordem política, porque se trata de um juízo totalmente distinto e independente da ordem penal (...) Num país democraticamente maduro, o que estaria em discussão era a substância do problema (ou seja, a censurabilidade política dos factos em causa) e não a legitimidade ou pertinência da apreciação da conduta do ministro do ponto de vista da sua responsabilidade política."

É uma pena o Vital Moreira de 2002 ter desaparecido. Jurista


1 comentário:

Anónimo disse...

Todo o artigo enferma de petição de principio. E isto porque:
No caso Portas/sondagens da moderna, existiam factos públicos conhecidos e provados por documento, como sejam:
- O nomeação como gerente da empresa de sondagens, acto público com registo comercial.
- Cheques confessadamente subscritos pelo Dr. Portas, bem como outros documentos públicos da sociedade.
- O dr. Portas até andava com um Jaguar da dita empresa de sondagens. Lembra-se disto, Lomba!! Ou ainda era muito pequeno(novo)
Ora o DR. Portas veio afirmar que os cheques tinham sido assinados em branco, pelo que não sabia para que finalidades tinham sido utilizados posteriormente.
- O Dr. Vital Moreira, considerou, e bem, que quem se desculpa com cheques passados em branco, numa empresa da qual utilizava o carro ( Factos públicos e confessados pelo próprio) demonstravam uma atitude irresponsável e que essa atitude irresponsável como gerente de uma sociedade relevavam para a imagem do político...
No Caso das escutas, apenas existem suposições sobre o que terá sido dito numa conversa telefónica gravada ilegalmente e que resulta de uma intromissão na reserva de vida privada do PM.
Ainda acha que é a mesma coisa!!???
Então deixe de se intitular jurista!!...