11.10.09

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POBRE JUSTIÇA!



Lapsos e amizade



Os dois magistrados que investigam o Freeport foram constituídos arguidos por um dia. Um zeloso colega de Vítor Magalhães e Paes Faria, a quem foi distribuída uma queixa contra estes, aplicou-lhes o estatuto à luz do anterior Código de Processo Penal, mas enganou-se. Nada mais normal... O problema, porém, não está no erro, mas no contexto, que não poderia estar mais envenenado.

A desconfiança da hierarquia contra os dois magistrados, as pressões internas e externas, a ‘campanha negra’ que foi feita contra eles, a campanha política que foi feita já chegavam para se suspeitar do ‘erro’. Agora, quando se sabe que o procurador em causa é homem que exercia a cidadania nas proximidades das candidaturas do PS à Câmara de Cascais, a coisa piora. Mas fica definitivamente ‘negra’ quando se sabe que foi ele o magistrado que desagravou os crimes imputados aos arguidos no processo em que era investigado José Luís Judas e actos praticados na Câmara de Cascais. Não querendo fazer juízos de valor negativos, porventura terá decidido bem nesse caso. Não convinha contudo que tivesse participado em acções de campanha política e que agora permaneça em situação de poder intervir em casos como o Freeport. A coisa pode ser formalmente irrepreensível, mas que é muito fedorenta, lá isso...

Eduardo Dâmaso, Director-Adjunto


No DIÁRIO DE NOTÍCIAS

O procurador-geral da República (PGR) afirmou ontem que foram cumpridos todos os requisitos na indigitação do magistrado Varela Martins, que está a investigar colegas no caso Freeport.



"Era aquele o procurador a quem tinha de calhar o processo. Foram absolutamente seguidas a regras. O processo foi entregue ao procurador que por escala lhe competia. Não há nenhum mistério nisto", afirmou Pinto Monteiro, que proferiu uma palestra no curso de Direito da Comunicação, na Universidade de Coimbra. Referiu que, se a procuradora-geral distrital "não entregasse o processo ao procurador, estaria a distribuir o processo de forma anómala".

Um estação de televisão recordou que o mesmo magistrado ficou conhecido no passado por ter arquivado um processo contra o antigo presidente da Câmara de Cascais José Luís Judas e por ter aparecido depois num jantar de homenagem a esse autarca eleito pelo PS.

Questionado sobre se o magistrado Varela Martins não deveria requerer escusa para intervir neste processo, Pinto Monteiro disse não saber o que se passou no passado, e que não se iria pronunciar sobre situações anteriores ao seu cargo de PGR.

Varela Martins vai ter sob a sua alçada o inquérito criminal aos procuradores que investigam o processo Freeport, instaurado pelo procurador-geral a partir de uma queixa do arquitecto Carlos Guerra, antigo dirigente do Ministério do Ambiente.


No JORNAL DE NOTÍCIAS:


Freeport: PGR diz que o "lapso" já foi corrigido


NELSON MORAIS

"Um lapso". Foi assim que, ontem, o PGR classificou a entrega do processo contra os titulares do Freeport ao procurador Varela Martins, a quem são imputadas ligações ao PS. Mas, disse Pinto Monteiro, "o lapso foi corrigido".

De qualquer modo, Pinto Monteiro, o procurador-geral da República, afirmou, em Coimbra, que a distribuição inicial do processo ao procurador-geral adjunto Varela Martins respeitou as regras. "No Tribunal da Relação [de Lisboa], a senhora procuradora-geral distrital entregou o caso ao senhor procurador-geral adjunto por escala", contou. Se assim não fizesse, acrescentou, "estaria, então, a distribuir o processo de uma forma anómala".

O "lapso" consubstanciar-se-á na hipótese de as supostas relações de Varela Martins com o PS não garantirem a sua imparcialidade para lidar com um processo que envolve, pelo menos indirectamente, militantes deste partido? Pinto Monteiro não se explicou, mas a resposta afigura-se afirmativa, sendo certo que a entrega do processo a um novo procurador foi anunciada depois de a TVI, na sexta-feira, ter denunciado o caso.

Varela Martins foi quem arquivou as suspeitas de corrupção sobre o ex-autarca de Cascais José Luís Judas. E, depois desse arquivamento, em Maio de 2006, o extinto "Independente" recuperou uma fotografia em que aquele procurador aparecia ao lado dos socialistas José Luís Judas, Jorge Coelho e Alberto Costa, o actual ministro da Justiça, na mesa de honra da candidatura de José Lamego à presidência de Cascais.

Entretanto, Varela Martins foi promovido e transitou de Cascais para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde começou por lhe ser entregue o inquérito aberto na sequência de uma queixa-crime de Carlos Guerra, arguido do Freeport que presidiu ao ICN, quando José Sócrates era ministro do Ambiente.

Carlos Guerra queixa-se de alegada falta de isenção dos procuradores do Freeport, Paes de Faria e Vítor Magalhães, e tornou-os suspeitos, também, de fugas de informação. E Varela Martins entrou a matar. Na quarta-feira, ouviu os dois colegas e constituiu-os arguidos. Isso punha em causa a sua continuidade da investigação, mas, um dia depois, recuou, explicando, segundo a TVI, que se esquecera de que, nas novas leis penais, "a constituição de arguido já não é um acto automático". Outro lapso.


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