2.2.11

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A última oportunidade de Cavaco

Cavaco Silva, agora reeleito presidente, tem pela frente uma tarefa ciclópica: fazer esquecer a insignificância do seu primeiro mandato. Será que o consegue? O presidente, enquanto árbitro de todo o sistema político constitucional, deve zelar pelo regular funcionamento das instituições. Tem de garantir que os diversos poderes - Executivo, Legislativo e Judicial - cumprem cabalmente as suas funções. O que não vem acontecendo, nem de perto nem de longe, enquanto Cavaco assobia para o lado.

As instituições políticas estão completamente desacreditadas. O Parlamento, sede da democracia, teria por missão legislar e fiscalizar a actividade governativa. Mas a Assembleia da República está instrumentalizada pelo Governo e pelos aparelhos partidários. Sem funções relevantes, os deputados entretêm-se a fazer negócios. Temos assim dezenas de deputados a acumular a função parlamentar com a de administradores, directores ou consultores de empresas que têm negócios privilegiados (e que negócios!) com o Estado português. Será um funcionamento "regular" do Poder Legislativo? O Poder Executivo, por sua vez, envergonha-nos. Sócrates diz-se e contradiz-se, está envolvido em sucessivos escândalos, escolhe para aliados internacionais os maiores ditadores. Não hesita no favorecimento às empresas amigas do regime. Será isto, também, o "regular" funcionamento do Poder Executivo? Por último, estará em situação regular o Poder Judicial, a maior disfunção da nossa democracia? Para que serve esta justiça, incapaz de combater a corrupção, apenas ágil a perseguir os mais fracos?
Cavaco Silva entrou na política pela porta grande, pela mão de Sá Carneiro, em ruptura com o sistema. Mas foi sendo assimilado pelo regime. No seu primeiro mandato aceitou ser o representante máximo dum regime podre. Em contradição com a sua própria história, tem hoje a seu lado Ramalho Eanes, aquele que foi o maior adversário de Sá Carneiro. Sintomático!
Apesar de tudo, o povo decidiu dar-lhe uma segunda e última oportunidade. Se Cavaco Silva souber interpretar a revolta dos cidadãos, se obrigar o sistema a regenerar-se - só assim sairá da política pela porta grande por onde entrou.

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