5.10.11


Porque é que o governo precisa dos sindicatos

Por Ana Sá Lopes,



António José Seguro disse finalmente, à saída da audiência com o Presidente da República, ao que vinha. Irá fazer parte de uma nova “União Nacional”, independentemente de estar ou não no governo. Depois do anúncio de Vítor Gaspar sobre as finanças da Madeira e a necessidade de “ir mais além do que a troika”, a declaração de António José Seguro foi um prodígio de contemporização com o que vem aí. Ficámos a saber que o PS está com o governo porque está com o memorando da troika e pede, simpaticamente, apenas “um bom diálogo institucional” e “partilha de informação”, de maneira a que “os principais responsáveis pela execução desse compromisso sejam bem sucedidos”. O subtexto é evidente: o PS sustentará politicamente o governo, quer esteja dentro, quer esteja fora. E com uma crise sem precedentes a nível europeu, até os mais radicais do PS se podem convencer um dia destes que, em nome da pátria, o PS vai ter de fazer parte do bloco central – principalmente se o CDS decidir ou for obrigado a saltar fora.

Portanto, com este PS o governo não tem nada com que se preocupar, pelo menos para já. A declaração de Seguro (sem direito a perguntas, o que também é uma nota interessante) foi o pré-anúncio do sentido de voto do Partido Socialista no próximo Orçamento do Estado – o PS abstém-se, claro. De resto, até Francisco Assis, o opositor de Seguro nas últimas directas, também defendia o mesmo. O estado de graça dos governos também se mede pela estratégia da oposição.Mas para a União Nacional não rebentar com as medidas da troika e o “mais além” – que vai tornar 2012 o ano mais desesperado dos últimos 20 – precisa in extremis da “cooperação” do PCP, do Bloco de Esquerda, dos sindicatos em geral, da CGTP e da UGT. E esta espécie de cooperação é tão decisiva para a sobrevivência do governo como a do PS.

É claro que tanto o PCP como o Bloco de Esquerda e como os sindicatos estão contra as medidas da troika e o próximo Orçamento do Estado. Mas o combate promovido pelos partidos à esquerda e pelos sindicatos faz parte do “sistema”, da oposição organizada, institucionalizada e, digamos, “segura”. As manifestações organizadas são o melhor antídoto contra a queda do poder na rua. O verdadeiro risco para o governo está fora do sistema – como os movimentos de indignados que já andam em Wall Street. O regime cavaquista caiu com um bloqueio inusitado da Ponte 25 de Abril que não foi organizado por nenhum sindicato. O governo devia acender todos os dias uma velinha à Senhora de Fátima para que a esquerda e os sindicatos conseguissem “organizar” devidamente os protestos, porque o farão sempre dentro do sistema. Digamos que, daquele lado, há protestos fortes – como no sábado em Lisboa e Porto –, mas nunca surpresas. Além de seduzir António José Seguro, Passos Coelho deveria empenhar-se tanto quanto possível em seduzir a esquerda e os sindicatos – como, de resto, já fez com Mário Nogueira, o líder da Fenprof. A oposição organizada é, neste momento, e paradoxalmente, a maior válvula de segurança do sistema.

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