17.10.11


Operação choque e pavor


Por Ana Sá Lopes


O estado de guerra será destruidor dos efectivos nacionais e, no fim, inglório


Os portugueses ficam hoje a conhecer o orçamento que formaliza a operação choque e pavor – uma guerra declarada pelo governo para cumprir o objectivo de "ir além da troika", alegadamente para nosso "bem". Uma parte do "bem" é a continuação de financiamento nos mercados internacionais, os mesmos que já não financiam a custos aceitáveis meia Europa, à medida que se percebeu que o euro estava metido num beco sombrio, à espera de uma saída miraculosa. Infelizmente, a menos que a cimeira de 23 de Outubro traga uma solução razoável para a crise da dívida da Europa – incessantemente pedida por todos os actores da economia mundial – caminharemos para o abismo. O estado de guerra será absolutamente destruidor dos efectivos nacionais, já em sofrimento e anemia provocados pelos sucessivos PECs de Sócrates. E, no fim, será inglório.
O facto de Pedro Passos Coelho ter prometido incessantemente que, consigo, não haveria mais aumentos de impostos para a classe média fustigada, que os funcionários públicos não seriam atingidos, que o sol brilharia para o crescimento das empresas e que sonhar com o corte dos subsídios de Natal e de Ano Novo era um puro "disparate" torna tudo ainda mais penoso. Para ganhar as eleições, Passos fez um interlúdio no seu verdadeiro pensamento – expresso no livro "Mudar" e na proposta de revisão constitucional do Verão passado. A cavalo do programa da troika e da crise internacional (e atirando as culpas para o extinto governo PS, também ao contrário do que tinha solenemente prometido) está a ser possível ao PSD liberal fazer o seu verdadeiro programa – expurgar a justa causa dos despedimentos; reduzir funcionários públicos e diminuir o vencimentos aos restantes; limitar o serviço nacional de saúde, e vários etecéteras. Não era um agradável programa de campanha, por isso foi devidamente escondido enquanto foi preciso. Afinal, as gorduras do Estado mais populares (e inconcebíveis) como os altos vencimentos dos gestores, os desperdícios de gastos em "mordomias" e automóveis, a loucura que atravessou as empresas públicas, eram um excelente aperitivo para a refeição que verdadeiramente estava para ser servida – a redução do apoio do Estado ao cidadão comum e um ponto final num sistema que chegou à Europa no pós-guerra e a Portugal só depois do 25 de Abril. A agenda ideológica de Passos Coelho nunca foi popular em Portugal, incluindo no seu PSD. Agora, o genuíno programa está a passar como se fosse imposto, se não por fora, pelos desmandos de Sócrates. Coincidindo a implosão do Estado com a implosão social, nem para Passos Coelho o timing é bom.

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