30.3.11

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A "barafunda" faz subir o rating de Sócrates

por Ana Sá Lopes
Defender a "thatcherização" da sociedade é uma campanha boa nos Estados Unidos mas, até ver, péssima em Portugal
Estamos conversados: José Sócrates desencadeou a crise política no momento que lhe foi mais favorável - se não para ganhar as eleições, pelo menos para as perder por poucos. Toda a novela que rodeou a aprovação do PEC, feito a meias com a Comissão Europeia e sem uma palavrinha simpática a quem o podia fazer aprovar (o PSD) ou pressionar nesse sentido (o Presidente), não deixa margem para dúvidas. É óbvio que Bruxelas exigia mais austeridade, como vai exigir a Passos Coelho, e que qualquer governo está amarrado a um Conselho Europeu nas tintas para conceitos outrora considerados básicos na aventura europeia, como a coesão. Com PS ou PSD à frente do governo, o nó cego é o mesmo.
Posto isto, quanto mais se afunda o rating da República, mais sobe o rating de Sócrates na bolsa eleitoral portuguesa. O argumentário é perfeito: "O pior que pode acontecer é esta barafunda" foi o slogan ontem lançado pelo primeiro-ministro à porta de São Bento, onde fez mais um dos comícios pré-eleitorais. Com os juros sobre as Obrigações do Tesouro a tocarem os 8,991%, pior não podia acontecer.
Se esse estranho eleitorado chamado "mercados" já chumbou a crise política, ninguém garante que, à medida que subir a dramatização socialista, o outro, o autêntico e legítimo, não o faça também.
A entrevista de Passos Coelho à Reuters, onde declarou que chumbou as medidas porque ainda queria mais cortes, pode transformar-se num prodígio de popularidade. A juntar a isto, a trapalhada gerada no PSD à volta da possibilidade do aumento da IVA, pode transformar a campanha numa bomba-relógio para o partido que, pela ordem natural das coisas, deveria agora ganhar tranquilamente as eleições legislativas.
Mas a ideia de uma vitória tranquila poderá estar completamente posta de parte na cabeça dos sociais-democratas sensatos.
O "même" de Sócrates - "O PSD que apresente as medidas!" - poderá ser multiplicado até à exaustão com dividendos razoáveis. Afinal, que medidas vai apresentar o PSD? Cortar que parte do Estado? Somar quanta austeridade à austeridade em curso? Não será um corte dos Institutos Públicos (embora deva ser feito, evidentemente) que resolverá a meta irreal do défice que também Passos Coelho prometeu cumprir. Vai o 13º mês dos funcionários públicos ao ar? Digamos que não há soluções instantâneas para cumprir uma meta absurda para países que até há pouco tempo saíram do terceiro-mundismo, como Portugal. Gastou-se mais do que se devia em mordomias estatais e obras redundantes? É claro que sim. Há sobreposições e institutos inúteis no Estado? É óbvio. Mas a parte de leão da despesa pública serve para pagar professores e médicos. No dia em que decidirmos ter menos Estado, é aí que vamos cortar, como fez a Inglaterra de Thatcher há muitos anos. Defender a thatcherização da sociedade é uma campanha boa nos Estados Unidos, mas, até ver, péssima em Portugal. Este é o risco do PSD.

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