6.5.11


Causas e Consequências

A grande euforia

Nos cuidados intensivos, em que nos encontramos, vivem-se momentos inesquecíveis de euforia.
    Por:Constança Cunha e Sá, Jornalista


Perante os festejos nacionais em curso, o dr. Francisco Assis decidiu pedir aos portugueses para não embarcarem num "clima de euforia", depois de ouvirem o primeiro-ministro elogiar o fabuloso acordo que o Governo conseguiu impor aos mesmos interlocutores que, ainda há uns tempos, deixaram a Grécia e a Irlanda nas ruas da amargura. Compreende-se que o dr. Assis tenha procurado pôr alguma água na fervura no delírio que se apossou do País, depois de saber que, à beira da bancarrota, foi obrigado, contra todas as promessas, a recorrer, mais uma vez, aos bons ofícios do FMI. Mas, convenhamos que a tarefa não é fácil. Por mim falo: convencida de que íamos morrer da cura, sinto--me naturalmente eufórica por saber que nos limitámos a entrar em coma.
Nos cuidados intensivos, em que nos encontramos, vivem-se momentos inesquecíveis de euforia. Como é que podemos não ficar eufóricos quando sabemos, por exemplo, que vamos ter uma recessão de dois por cento para os próximos anos? Ou que, para grande euforia dos trabalhadores, o número de desempregados vai disparar para 13 por cento, continuando a bater os mais improváveis recordes?
Para cúmulo, graças à habilidade negocial do primeiro-ministro, podemos continuar a contar com o 13º e 14º mês (um feito que a chamada troika só evidenciou quando garantiu que isso nunca tinha estado em causa), não vamos ter mais cortes nos salários (porque já os fizemos) nem despedimentos na Função Pública (apenas vinte e tal mil até 2013, o que é uma ninharia se pensarmos que estava em curso uma verdadeira razia no número de funcionários). Como se vê, com o País à beira do abismo, as boas notícias sucedem-se a um ritmo alucinante, criando uma onda de optimismo difícil de contrariar.
Particularmente eufóricos estão, como é óbvio, os desempregados que, a partir de agora, passam a ter de contar com um leque esfuziante de medidas: subsídios mais baixos, diminuição dos prazos de atribuição dos mesmos, pagamento de impostos e outras regalias avulsas. Isto para não falar, evidentemente, dos reformados, dos contribuintes, dos que levados pela ilusão do crédito fácil adquiriram casas próprias, dos que dependem do Serviço Nacional de Saúde e de outros privilegiados que andam por aí à solta, como todos aqueles que, a partir de agora, vão poder ser despedidos de forma mais barata e expedita. Melhor do que isto parece impossível. Mas na certeza de que tudo podia ser pior, é, pois, com uma imensa euforia que assistimos ao nosso próprio colapso. Valha-nos, ao menos, o bom senso do dr. Assis!

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