14.2.11

Carta aberta ao presidente do PS

por Henrique Neto

Convido-o a organizar um debate aberto aos militantes, com a participação de ambos, sobre a democracia interna e sobre as causas da inexistência de debate político no PS
Estou feliz por o Presidente do PS ter vindo a terreiro discutir a democraticidade interna do Partido Socialista, coisa rara, ainda que tenha utilizado duas páginas de jornal para dizer muito pouco e esclarecido ainda menos. Além de tentar julgar a verdade dos outros em causa própria, o que nem sempre é uma boa prática. Porque de facto o Dr. Almeida Santos sabe melhor do que ninguém de que falei verdade, limitando-me a dizer em voz alta o que muitos militantes do PS dizem em surdina.

E como me pede respostas aqui as tem:

1. Aquilo que denunciei, e que se passou na última Comissão Nacional, foi confirmado pelo próprio Dr. Almeida Santos na sua carta aberta, ou seja, que um dirigente do PS se queixou ao Presidente do partido de que as actas não são entregues aos militantes antes de serem votadas e que, com demasiada frequência, não condizem com as intervenções feitas. A declaração deste nosso camarada apresenta casos concretos e a única via para o esclarecimento e a reposição da verdade é publicando o texto no jornal do partido, o que naturalmente lhe peço que seja feito. Sei que o nosso camarada concorda com essa publicação.

Como isso não bastará para se saber quem fala verdade, sugiro também a publicação das datas de aprovação das actas e do número e orientação dos votos expressos em cada uma das votações. É ainda importante clarificar as razões de as actas não serem distribuídas antes da sua votação, para que os dirigentes presentes as possam consultar e votar em consciência. Aliás se, como confessa na sua carta, " o presidente propõe ao plenário o necessário mandato à mesa para poder aprovar a acta", antes mesmo de ser redigida, é óbvio que estamos em presença de, no mínimo, uma lamentável ausência de pedagogia democrática, que, como sabemos, conduz ao hábito dos militantes se autolimitarem nos seus direitos e nas importantes funções para que foram eleitos.

2. Por outro lado, o facto de o Presidente do PS, ou a Mesa da Assembleia, não aceitarem o pedido escrito de um dirigente eleito para que seja distribuído um seu texto crítico sobre a condução dos trabalhos, se não é censura o que acha que será?

3. Para informação do Presidente do PS, iniciei a minha militância contra o anterior regime aos quinze anos e folgo que também o tenha feito cedo, todavia isso não nos dá, a ambos, qualquer direito especial e menos ainda o de usar esse estatuto para limitar a participação democrática seja de quem for. Apenas nos dá o dever acrescido de sermos mais escrupulosos e mais rigorosos, dando o exemplo de ética e pedagogia das boas práticas democráticas. A este respeito, talvez o Manuel Maria Carrilho se recorde tão bem como eu do que se passou no XIII Congresso do Partido Socialista realizado na Expo sob a direcção do Dr. Almeida Santos.

3. Concedo que a censura praticada no PS é feita com a passividade, porventura com o acordo, da maioria dos militantes nos órgãos do partido, mas ninguém desconhece que esses militantes foram, na sua esmagadora maioria, escolhidos a dedo pela direcção, que o debate interno não existe, que as sedes estão vazias e que as poucas reuniões partidárias existentes, mesmo em Lisboa, se realizam com meia dúzia de militantes. Ou, já agora, porque acha o Presidente do partido que não existe oposição interna ao actual secretário-geral e as votações são praticamente unânimes, recordando-nos o triste passado contra o qual lutámos?

4. Ou porque terá o PS alterado as condições anteriormente existentes no regulamento eleitoral, no sentido de, no próximo congresso, apenas os candidatos à liderança poderem apresentar moções? Será que é para facilitar o debate interno no partido com o objectivo de surgirem "as novas ideias" que o secretário- -geral reclama?

5. Tenho na minha frente o "Diário de Leiria", em que o militante Cândido Ferreira, que tinha anunciado a sua candidatura à liderança do partido no próximo congresso, diz agora, depois de ter falado com o Presidente do PS: "É com natural repúdio que verificamos que a candidatura ''natural'' de José Sócrates já está a utilizar os meios que insistentemente temos solicitado e nos têm sido sistematicamente negados." Acrescentando: "Violação grosseira das regras que devem presidir a eleições dentro de qualquer estrutura democrática e respeitadora de princípios universalmente aceites." O que me pode dizer o Presidente do PS sobre isto, ou, já agora, sobre as últimas eleições para a Federação de Coimbra?

6. Se, como espero, o Presidente do PS está interessado em contribuir para a democraticidade do partido e para a reposição da verdade, convido-o a organizar um debate aberto aos militantes, com a participação de ambos, sobre a democracia interna e sobre as causas da inexistência de debate político no PS, nomeadamente quando isso mais falta faz ao nosso partido, neste tempo em que os portugueses expressam a sua desconfiança nos partidos políticos e nas pessoas que, como o Dr. Almeida Santos, os dirigem.

Lamento profundamente que o debate interno no nosso partido se limite às "missas" previamente organizadas, cujo resultado final só pode ser a decadência e a irrelevância. É isso que procuro contrariar e se o Presidente do PS não gosta, paciência.

Apresento-lhe as minhas cordiais saudações democráticas e socialistas.

1 comentário:

Anónimo disse...

O problema está no facto de o Sr. Neto ter baseado a sua crítica ao funcionamento da CN do PS em mentiras que, nesse caso, justamente Almeida Santos referiu. Isso mesmo pode ser visto em posições públicas de pelo menos um elemento da Esquerda Socialista que realmente esteve na CN neste mandato.
Nessa carta aberta o Sr. Henrique Neto assobia para o lado , nem desmente AS nem insisite nas mentiras , limitando-se a desafi´-lo para um debate. Seriedade política, eis o que se lhe devia exigir.