14.2.11

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EDITORIAL

A incompreensível moção do Bloco

por Ana Sá Lopes,
O Bloco comunga com o PRD o ser um agregador de descontentamentos de esquerda. Arriscam-se a ter o mesmo fim.
Uma moção de censura serve para derrubar um governo? Verdadeiro, reza a Constituição. Falso, diz a doutrina revista e acabada de publicar pelo Bloco de Esquerda. Uma moção de censura passou a ter, desde o anúncio de quinta-feira, o mesmo valor facial de um comício, de uma manifestação ou talvez de uma conferência de imprensa cheia de "dramatização" para ser transmitida em directo à hora do jantar.
O Bloco deseja que ninguém leve a sua moção a sério: a sobrevivência do partido depende agora, principalmente, de não o levarem a sério, apavorado que está com a moção que inventou e com o risco da sua "utilidade prática", a tal que dias antes Francisco Louçã não descortinava. 
O que aconteceria ao Bloco de Esquerda se, por uma daquelas surpresas que a vida política prodigaliza, o PSD e o CDS se juntassem a dizer sim, no dia 10 de Março, ao derrube do governo? Nem vale a pena especular sobre os votos que se transfeririam directamente do Bloco de Esquerda para o PS, quando o eng. Sócrates chorasse as suas mágoas de derrubado perante os eleitores de esquerda, em plena crise da dívida e do euro, e com o fantasma da iminente eleição de um parlamento e de um governo de uma direita. 
O aflitivo tom de José Manuel Pureza na sexta-feira passada a anunciar que a censura se destinava "à direita" - não fosse o diabo tecê-las - e o discurso confuso de ontem de Francisco Louçã a explicar que a moção de censura "tem como função combater e procurar vencer os erros políticos que promovem o desemprego e a precariedade" dão a nota do desvario e da precipitação de um partido exangue por uma campanha presidencial passada em comunhão com o PS no apoio a um candidato sem discurso audível pelo eleitorado bloquista. A guerra privada que PCP e Bloco mantêm, mais em privado do que em público, fez o resto. 
Há mais de 20 anos, um partido chamado PRD - um sucesso nas eleições de 1985, 18% dos votos - decidiu apresentar uma moção de censura ao governo minoritário de Cavaco Silva. O motivo que despoletou, visto à luz do presente, foi uma anedota. Nesse ano, Cavaco Silva tinha desautorizado a Assembleia da República, depois de uma delegação parlamentar se ter esquecido que Portugal não reconhecia a ocupação das Repúblicas Bálticas pela União Soviética e de um certo passeio pela Estónia guiado pelo Kremlin se ter tornado muito desconfortável. 
Na sequência da aprovação da moção de censura, o então Presidente da República, Mário Soares, decidiu marcar eleições antecipadas - contra a vontade dos censores que apostavam num governo PS-PRD. Em sequência, Cavaco Silva obteve a sua primeira maioria absoluta em 1987 e o PRD - nascido à sombra do antigo Presidente Eanes - reduziu-se à ínfima expressão e depois a pó. O Bloco comunga com o PRD o ser, eleitoralmente, uma amálgama agregadora de descontentamentos de esquerda. Alimentados por uma raiz comum, arriscam-se a ter o mesmo fim.

1 comentário:

Anónimo disse...

A moção de censura do BLOCO vai provocar instabilidade nos mercados (é verdade!) mas vai também dar oportunidade aos eleitores (se votarem contra o BLOCO PS/PSD/CDS) de experimentarem soluções diferentes para resolver os problemas com os quais o país se confronta e cujos resultados são, infelizmente maus. Com novas eleições os portugueses terão a oportunidade de escolher: OU "COMEM MAIS DA MESMA FRUTA" OU VÃO EXPERIMENTAR OUTRAS SOLUÇÕES ALTERNATIVAS. No primeiro caso: Para quem acredita que a única solução é apenas aquela que nos tem sido imposta pelo Governo PS (com o apoio do PSD), as eleições antecipadas de nada servem e até pioram a situação; Para os outros: Para aqueles que acreditam que a solução do défice do Estado passa pelo combate à alta corrupção; aos gastos desnecessários com parcerias ruinosas para o Estado e com "estudos", que de nada servem, pagos a peso de ouro, a gabinetes privados; com a entrega de serviços públicos (os rentáveis) a empresas privadas para que lucrem chorudamente com eles, empresas que admitem frequentemente políticos saídos recentemente do poder, pagando-lhes ordenados a que já chamaram de "pornográficos"; Governos que entregam aos privados as Empresas rentáveis e deixam para o Estado aquelas que dão prejuízo para que todos paguem; Governos que se recusam a taxar as verdadeiras fortunas e bens de luxo altamente valiosos mas que cortam nos abonos de família, no pagamento de ambulências e na ajuda à compra de medicamentos; que se recusa a taxar de forma justa os lucros chorudos de certas Empresas, obtidos à custa dos preços exorbitantes que levam pelos serviços essênciais que prestam e qu não têm real concorrência, como a GALP, EDP, REN, Bancos,...; Governo que se recusa a taxar de forma justa vencimentos de certos gestores que chegam a ganhar mais do que o Presidente dos EUA ou do Banco Federal Americano; Governos que cortam nos vencimentos de 1500 euros mas que não tocam nas pensões de 5 ou 10 mil; Governos que recusam a reforma a quem trabalhou e descontou durante 40 anos mas permite múltiplas reformas de muitos milhares de euros ao fim de poucos anos a certas individualidades; Governos que dizem preocupar-se com os milhares de jovens desempregados mas que os mantêm nessa situação quando poderiam reformar os mais velhos, que já descontaram durante muitas décadas (Seria melhor dar-lhes o merecido descanço a manter os jovens desocupados, perdendo hábitos de trabalho e qualificações). Governos que estão agora a "cozinhar" o aumento da idade das reformas e alterações às indemnizações em caso de despedimento dos mais velhos, para que o seu afastamento fique mais económico e sejam despedidos sem terem sequer direito a uma justa indemnização nem à reforma. Enquanto o país definha as empresas acima referidas vão subindo sempre os seus lucros sem que o Governo crie leis para taxar seus lucros. Não acredito que a GALP, EDP, REN ou Bancos abandonassem este país caso passassem a pagar mais. Paradoxalmente, acontece o contrário: pagam cada vez menos.

Zé da Burra o Alentejano