Deustchland über alles
Por Ana Sá Lopes
Não havendo dinheiro para resgatar a Itália não há futuro para o euro
A União Europeia enquanto euforizante união das democracias foi informalmente extinta, embora ninguém ainda nos tenha avisado – só assim se percebe que a reacção dos ocupados esteja a ser tão lenta. O processo revolucionário em curso nos corredores de Bruxelas consagrou a ditadura da Alemanha, a que o resto dos países se submetem apalermados, sem arriscar a dignidade de uma reacção aborrecida. Nesta altura do desvario gravemente antidemocrático, já nem Merkel nem os outros responsáveis alemães se preocupam com fingir – ontem, antes de Berlusconi anunciar a saída e de ser conhecido o resultado da votação no parlamento de Roma, o porta-voz do partido de Angela exigiu, sem contemplações, o abandono do Caimão. “Toda a gente sabe que Berlusconi não é capaz de resolver os problemas de Itália”, disse Herr Fuchs, do alto da sua autoridade.
Há milhares de razões para não se chorar o desaparecimento de Berlusconi da cena italiana, que corrompeu perante a passividade atávica dos seus parceiros europeus e amigos do Partido Popular. Mas é significativo do fim da ideia de uma Europa democrática vê-lo atirado borda fora na sequência dos pontapés da chanceler alemã, a mesma que tinha despedido George Papandreou, o que ousou afrontar – com a ideia do referendo – a chefe.
O efeito dominó da crise do euro chegou agora ao ponto de não-retorno, com a queda da Itália. Seguir-se-ão Espanha e França. Não havendo dinheiro para resgatar nem sequer a Itália, percebe-se que não há futuro nenhum para o euro.
Não existe valium salvífico para “acalmar” os mercados, que perceberam que, tal como está concebido, o euro é uma moeda à beira da extinção. O seu fim está próximo e nenhuma cimeira, declaração, pacto, etc., repetidos de há dois anos para cá, tocou no problema central – a fórmula institucional da zona euro não serve e as que poderiam servir não são aceites pelos povos europeus, como seria o caso dos Estados Unidos da Europa ou uma coisa com outro nome qualquer, em que a uma moeda comum fosse associado um banco central como a reserva federal dos States. E uma democracia, já agora.
Nada disso vai acontecer.
O Bundesbank não deixa o BCE imprimir dinheiro e criar alguma inflação. A crise veio demonstrar que uma moeda decalcada do marco alemão, arquitectada para a Alemanha e para mais nenhum país europeu, apenas está a conseguir impor o Deustchland über alles e, no fim, a tragédia económica, à qual nem a Alemanha nem o resto do mundo escapam. Impressionantemente, os líderes europeus aceitam o estado das coisas como, nos anos 30, aceitaram o nazismo. Foi para enterrar este fantasma que a Europa foi construída – agora, com as democracias confiscadas por Berlim, ele está aí, outra vez, à solta.
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